Difícil não é sentir a falta de quem nos faz falta.
É pensar no tempo que falta, no tempo que não volta e sufoca, e nas voltas da vida que o tempo nos dá. Fica a esperança de que o tempo aqui me sorria e me traga a vida de volta.
E tem sorrido...


24.9.07

Rumo ao Norte

Saímos de Luanda já a manhã era tarde, por volta da mesma hora em que o sol decidiu aparecer. Era meio-dia e tínhamos meio dia pela frente. Seguimos de carro por entre estradas de miséria e musseques de gente e lixo de mais gente, caindo e ensombrando os buracos do caminho. Passamos sobre rios parados imundos e coloridos pelo acumular dos detritos, das sobras do que sobra dos musseques que nasceram mortos nas suas margens. As crianças vão brincando sozinhas escondidas na neblina de um cheiro ardido da lixeira onde vivem. Vi a maior das pobrezas da vida.
Uma vez passando o Cacuaco, a miséria dá lugar à beleza da paisagem, que une através da estrada a terra vermelha a nascente e o mar azul a poente. Surgem os imbondeiros e as palmeiras e os coqueiros e mangais, aqui e ali, em verde esperança, salpicando o horizonte. Mas também aqui a pobreza reaparece e nos acompanha inquietante na viagem, para que não nos deixemos de lembrar onde estamos, ou para nos fazer ver que aqui nunca há sonho sem pesadelo. Nunca. Mais lixo e quase casas e mais gente que nem é gente, vivendo em sobrevivência.
Deixamos a estrada principal que segue para o Caxito e viramos à esquerda até ao litoral, rumo ao mar e ao destino planeado antes na partida: A Barra do Dande.
Andámos 60 Km desde que saímos de Luanda, demorando-nos no percurso por quase duas horas, detidos pelo horror contido do trânsito e da paisagem e pelos buracos que fazem a estrada. No entanto, tudo muda. Chegando à Barra do Dande, e depois da nova ponte que liga a aldeia à outra margem do rio encontramos enfim uma praia sem fim. Deixei-me encontrar por um paraíso selvagem que me ilumina os olhos bem mais que a ténue luz do sol desse dia. E estava um dia quente e calmo, igual ao imenso mar turvo que apareceu majestoso à minha frente. Ao longe, pela praia e até onde a vista pode alcançar só vejo o mar, areia e coqueiros, intemporais, numa comunhão perfeita da Natureza - a única beleza infinda destas terras de Angola. Sem gente... Um resort apenas, com alguns bungalows e tendas e cabanas suspensas sobre estacas em madeira. Hum... e boa comida.
Voltámos ao final do dia. Estamos sempre dependentes da vontade do sol, seja pelo calor que nos oferece, seja pela luz que aqui precisamos para estar seguros. Bem... e também porque estava a ficar sem gasolina no carro e, apesar de aventureiro, essa não é mesmo uma experiência que quero passar por aqui.
Mas cheguei satisfeito ao meu quarto, nostálgico mas cheio de coragem para enfrentar mais uma semana. A verdade é que são mesmo estes os dias que aqui valem a pena.

4 comentários:

Sophia disse...

É impressionante como as tuas palavras ganham vida e revelam imagens!

Baci

Anónimo disse...

olá Pedro,

gostei imenso desta descrição perfeita.
continua assim.
um grande abraço
mfelix

Peter disse...

Olá Sophia!
Obrigado :) Espero que só fiquem as boas imagens! As más, por muito que tente, parecem-me sempre indescritíveis...
Baci :)

Peter disse...

Oi Mário!
Meu amigo, obrigado :) Um dia verás pelos teus olhos...
Abraço!

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