Difícil não é sentir a falta de quem nos faz falta.
É pensar no tempo que falta, no tempo que não volta e sufoca, e nas voltas da vida que o tempo nos dá. Fica a esperança de que o tempo aqui me sorria e me traga a vida de volta.
E tem sorrido...


23.6.07

Dia 13 - O Dia mais Longo

Aproveito hoje finalmente para conhecer outros recantos do hotel Trópico.

Espreitei pela janela o amplo ginásio, cheio de equipamentos (e bons, hã?) e vazio de gente. Tem também sauna, banho turco e jacuzzi. À maneira.

A piscina é ao ar livre, num espaço todo ele decorado a rocha nas paredes, com uma cascata fingida ao fundo, dando para a água fresca da piscina. Um bar logo à entrada (fechado, pois é inverno), e um espaço de esplanada, com mesas e cadeiras de madeira, separado da piscina por um pequeno muro e pela relva que lhe segue, onde se espalham cadeiras de praia. Passei aí a tarde.

Mais um convite para jantar. Desta vez conheci o Pinto's, em plena baixa da cidade. Muito agradável. Muito fino também. Caro, claro. Boa companhia. Mas gostei... Irei repetir mais vezes.

A noite reservava-me ainda o melhor da cidade: O Chill Out. Foi muito fácil gostar daquele espaço, ao ar livre e junto à areia da praia. É restaurante, bar, mas àquela hora é sobretudo uma discoteca. Mas com classe. Difícil foi pensar que estava ainda em Luanda. Muitos portugueses, boa música e melhor vista (tem várias interpretações).

Um mundo à parte. Outro mundo que não este. E pela primeira vez aqui senti pena pelo passar das horas. Neste calor da noite, sentia-me presente, mas ao mesmo tempo tão distante, desta indescritível realidade que é Luanda.

22.6.07

Dia 12 - O Dia mais Louco

Sexta-feira.
É que nem sei por onde começar.
Talvez pelo homem nú que passou em frente ao hotel, à hora de almoço. Não, realmente não vi o tamanho da coisa, mas vi a descontração com que passeava (!) na rua. Nú, completamente nú, em plena cidade. Talvez tenha sido assaltado, em plena luz do dia... Talvez. Mas não sei porque razão me sinto mais seguro em pensar que foi mesmo isso, e não outra coisa.
Poderei também falar nos grandes volumes simétricos da noiva que hoje casou no hotel. E das suas damas de honor. É normal aqui os casamentos à sexta-feira. É normal serem em hotéis, tal como se vê por aí. Mas não é normal ver algo assim. Nem aí. Muito bom.

Enfim, mas o melhor estava reservado para a noite. Literalmente, uma loucura. Ao hotel vieram buscar-nos um amigo de um amigo e o amigo do amigo desse amigo. O louco. Com o seu Volvo 3500 do século passado. Só não era um carro de combate pela velocidade que tomava. De resto até parecia que tinha lagartas. E o condutor só não era um louco porque... - não, afinal esse era mesmo louco. Um 'louco' que mete os candongueiros a um canto (e literalmente também). Com ele experimentei ultrapassagens pela direita, pelo meio dos carros, pelo passeio e em sentido proibido. E tudo isto em alta velocidade, por estas ruelas de Luanda. Ele é o maior, o louco. O maior. Está cá há 5 anos em Luanda... mesmo assim não tem desculpa. Nem juízo.

Bem, enquanto me beliscava para ter a certeza que estava ainda vivo e acordado, já fora do carro de combate, eis que algo faz de novo o meu coração bater mais depressa (mais ainda que quando vi a noiva). Ouvi um "clac-clac" e depois um tiro. A uns 20 metros de nós. Alguém achou que devia tentar roubar um carro ali mesmo, e os seguranças responderam, como mandam as regras: primeiro um tiro ao homem, depois um segundo tiro para o ar. Metralhadora AK47. É normal, dizem. Desconheço o resultado final da história, mas o tiro foi só um que se ouviu. E não foi para o ar.

A noite acabou com um jantar já tardio num restaurante que aguardou que nos sentássemos para se transformar numa autêntica discoteca - O Jango. As colunas a um metro da nossa mesa, e a pista de dança mesmo ali. Nada agradável mesmo. Quase não jantei, e quase nem dava para falar entre nós. E nem dancei, claro. Quem dançou foram as batatas que pulavam, e os talheres que tilintavam no meu prato. Com ritmo.

21.6.07

Dia 11 - A Tendinha

Gosto tanto deste restaurante que achei que merecia um post só para ele: A Tendinha, de Bruno Tendinha. Descendo a Rua da Missão, a uns passos do hotel, é o sítio que escolhemos para almoçar estes dias. Uma pequena esplanada cá fora (sem grandes vistas, é verdade) Mas lá dentro todo ele é uma mistura de culturas: umas paredes amareladas, decoradas com carapaças de grandes tartarugas, molduras e estatuetas de madeira, bandeiras de alguns países e entre as quais, claro, as dos 3 grandes do futebol português (sim, o Sporting também). Um pequeno balcão ao fundo da pequena sala, mesas e cadeiras de madeira com toalhas coloridas a rigor. No tecto da entrada um ar condicionado avariado, que justifica as grandes ventoínhas dispostas junto ás mesas. Ao fundo uma televisão, sintonizada num canal português, como em quase todo o lado aqui. Ao fundo também, ouve-se música africana ou reaggae. Um calor infernal lá dentro, um pouco mais fresco cá fora.
Mas então a comida? A comida. Portuguesa e angolana, da melhor que tenho provado. Desde funge a açorda de pão ou um simples bacalhau à portuguesa, ou até mesmo grelhados mistos. E vai variando todos os dias. Simples, mas com boa apresentação e ainda melhor gosto, a cozinha é mesmo um espectáculo.
A simpatia. Todo ele. O rapaz Bruno Tendinha não engana: é o autêntico comercial da restauração! Ao segundo dia recordou com sucesso o que iríamos pedir para beber, sempre com um sorriso e conversa para oferecer. E a casa sempre cheia, pois então. Portugueses, sobretudo. Mas também ingleses e outros que desconheço as origens.
E o preço? Juntando-o a tudo isto, não há mais dúvidas de que seja o melhor restaurante aqui destas bandas: por 2.000 Kuanzas (20 euros) faz-se a festa e ainda sobra para a gasosa.
Boa casa, a Tendinha. Pra mim está escolhido.

20.6.07

Dia 10 - Os Carros

Hoje vi o primeiro Opel Corsa.

Hummers, SUVs, Jeeps e Mercedes, esses sim, há que nem corsas aí em Portugal. Em cada rua que passo ou a cada passo que dou vejo carros que nunca tinha visto na vida. Desde os grandes 4x4 até pequenos carros coreanos e japoneses. Mas dominam as ruas os Toyotas. É sem dúvida a marca mais vista por cá. Há também os candongueiros - os transportes públicos (!) de Luanda, cujos condutores (?) são sem dúvida os mais perigosos na estrada. Sempre cheias de gente, as Toyota Hiace azuis e brancas ditam as leis nos cruzamentos e rotundas. Com nove lugares, mas onde vão sempre 90 pessoas, elas passam sempre primeiro que os outros, porque se metem mesmo onde não dá para passar. Porque são os maiores na estrada. E os passeios também contam, claro. São mesmo os maiores.

Os polícias de trânsito, onde os há, requerem escolta policial armada, dada a frequência com que estes são atropelados. Vêem-se alguns exemplares vivos, com um apito de brincar na boca, e que ajudam assim a uma maior confusão ainda. Mas ninguém lhes liga. Há também passadeiras por aqui, e alguns semáforos... Mas tal como os sinais de trânsito, nada significam. Existem apenas para não serem respeitados.

19.6.07

Dia 9 - A Noite

Os dias vão passando rapidamente, e eu vou consumindo o meu tempo com o trabalho e com os meus colegas, aproveitando a noite para ir aos poucos conhecendo a cidade. Tenho agora a certeza que a noite é a melhor altura para tal, não só porque o trânsito assim o permite, mas sobretudo porque Luanda é linda - à noite. Não creio que seja pela sua luz, mas sim porque ao fim do dia também a pobreza e a sujidade se deitam para dormir, e se tornam invisíveis para quem não as quer ver.
Na ilha, ao longo de 10 Kms, quer do lado da baía, quer virados para o mar, concentram-se os bares e os restaurantes. Quase todos ao ar livre, e com acesso á praia, têm o condão de me transportar para outros lugares. Por momentos esqueço-me mesmo que estou em Luanda. Vendo a cidade ao longe e alguns bares que já conheci, bem que podia estar em Manhattan. Ou em Miami. Ou mesmo em Lisboa (ou na magnífica vista do Barreiro sobre Lisboa!). No fundo, senti que poderia estar onde quer que a imaginação me levasse.
Hoje escolhemos o Budha Bar para jantar. Semelhante ao de Lisboa só em alguma decoração, é igualmente agradável, apesar de o termos encontrado quase vazio. Como é Inverno (!), e também por ser um dia normal de semana, é normal também estar às moscas. O restaurante, todo ele ao ar livre, mas com uns toldos que dão a sensação contrária, é de facto um sítio que apela a uma longa estadia, apesar do número de mosquitos que pairam sob a luz das velas, que se encontram, também elas, por todo o lado.
Volto ao hotel já cansado. Foram bons estes dois dias, pleno de emoções, de descobertas, e com boa companhia.
Volto cansado... mas deito-me a sorrir.

18.6.07

Dia 8 - A Salvação

Desço ansioso ao lobby do hotel, logo pela manhã. Entre um mar de gente, que chegou também nos primeiros voos do dia, vejo os meus futuros companheiros de aventura já a 'tentar' fazer o check-in na recepcão. E digo 'tentar' porque este processo arrastou-se durante a manhã toda, a tarde toda... o dia todo! Em vão, só pela noite se conseguiu arranjar estadia para todos, mas não aqui neste hotel. Apesar disso, o dia até correu bem. Para alguns é também a primeira vez em Luanda, e o impacto foi grande, apesar de amenizado pela companhia uns dos outros.
Entre apresentações e reuniões na empresa, a fome deu tempo para conhecer um outro restaurante aqui na cidade: O Trinca-Espinhas. Português, claro. Por dentro e por fora, para não variar. E no prato também. Boa comida, requintado e com um bom ambiente e atendimento. Não achei caro - aqui em Luanda, diga-se! Contudo, e apesar de se situar perto do centro, o acesso faz-se por algo semelhante a um 'caminho de cabras' (e é um elogio) onde só aos jipes se recomenda passagem. E mesmo assim, há buracos onde caberia, inteirinho, qualquer carro - Não, não estou a exagerar.
Ao fim da noite, depois de instalada toda a gente ainda saímos até à 'ilha' (o outro lado da baía de Luanda). Restaurante/Bar "O Cais de 4". Tem talvez a melhor vista da cidade! Sobretudo á noite. Afinal, de noite, esta parece uma cidade europeia. E é lindo, mesmo lindo. Toda a baía iluminada, quer do lado da cidade, onde se destaca toda a marginal com os seus prédios altíssimos e cheios de luz, quer do lado do mar e na própria baía, onde dezenas de barcos aguardam a sua entrada no porto de Luanda, já há vários dias, com toda a certeza.
Contemplando a cidade de longe, foi uma óptima maneira de terminar o dia.
Para eles foi o dia 0, para mim foi o melhor dos dias.

17.6.07

Dia 7 - O Fim do Princípio

Domingo.
Hoje é o último dia em que conto apenas comigo, pois o resto da equipa chega já amanhã.
Já não era sem tempo! - Penso. De facto, ao ler todo este blog parece-me tudo um pouco triste. Mas não estou nada triste, ok?
Mais um dia no hotel. Começo mesmo a sentir-me um 'residente' aqui. Muita gente me cumprimenta e tenho já uma mesa reservada no restaurante. Vou jantar e nem preciso de dizer nada. Trazem-me á mesa do costume a bohemia do costume e confirmam comigo o nº do quarto:
- É o 1004, não é senhor?
É sim, o costume.

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