Difícil não é sentir a falta de quem nos faz falta.
É pensar no tempo que falta, no tempo que não volta e sufoca, e nas voltas da vida que o tempo nos dá. Fica a esperança de que o tempo aqui me sorria e me traga a vida de volta.
E tem sorrido...


29.9.07

O Segundo Casamento

Hoje mesmo foi o dia do meu segundo casamento.
Ok... não me interpretem mal: hoje foi o dia do segundo casamento ao qual não pude ir, por aqui estar em Luanda. Mais um grande amigo que não pude neste dia ver nem desejar com um abraço sentido toda a felicidade do mundo. Como sempre. Mais um dia de partilha que não pude ter nem partilhar, com todos os outros amigos que fazem parte do meu mundo. Todos... Só eu não estive presente.
E como custa estar ausente! Nestes dias sinto mesmo a vida passar ao meu lado e o tempo passando também, perdido e desperdiçado. Sinto a falta da alegria e da amizade construída em tantos anos e tão bons momentos... Por momentos hoje senti-me arrependido.
Mas enfim... todo este meu dia passei-o lá. Com eles. Vivendo imaginando a sala e a gente, os noivos, as mesas repletas, a música, os amigos de sempre, o passar das horas e as nossas conversas que de tão vezes contadas já se tornaram histórias. Vivi um pouco destes momentos divinos, inesquecíveis e que para sempre serão contados, tornando-se novas histórias, de uma grande família.
Não estive lá... Mas tentei! E fi-lo com o pensamento e muita imaginação. Não resultou muito, pois passei o dia triste e a minha alma não mente - nada substitui o estar realmente presente. Mas para ti, meu irmão, aqui deixo um grande abraço. Neste dia tive-te sempre, bem pertinho do coração.

28.9.07

O Cinema

Hoje fui ao cinema ao Belas Shopping.
Sim... Estou em Luanda, claro! E o Belas Shopping é um centro comercial, inaugurado há pouco mais de um ano, e com muito bom aspecto. Quase parece que estamos em Portugal, e por momentos até tenho de pensar duas vezes para não pensar que sim. É um espaço agradável amplo e fechado, com lojas chiques e caríssimas, com um hipermercado e com um espaço de restauração onde se pode encontrar a Portugália ou outros restaurantes de todo o mundo. Todo... menos de Angola.
Bem, mas voltando ao cinema: numa das seis enormes salas do espaço que pouco tem a ver com Angola, decidimo-nos por ver o filme que mais tinha a ver: O Último Rei da Escócia. Sim, eu sei... já está aí em DVD, mas por cá ainda é o que se encontra de mais actualizado no mundo do cinema. E gostei. Muito! É daqueles filmes que dá que pensar, sobretudo a quem se decide a vir para África, ou a não vir. No principal papel vemos brilhando Forrest Whitaker, dando vida a Idi Amin Dada, antigo e controverso presidente do Uganda. E o Uganda está aqui tão perto, na distância e no tempo...
Aqui damos um sabor bem mais especial a estas coisas... A verdade é que o filme, sendo ficção, retrata uma história bem verdadeira e escondida dos olhos da humanidade durante muito tempo. Só consegui adormecer depois de pensar que em Angola isso seria impossível de acontecer nos dias de hoje. Tudo aqui está, afinal, à vista de toda a gente. Do mundo inteiro, ou para quem quiser ver.
A quem não viu ainda... recomendo.

26.9.07

Dia de Atraso

Acordo bem cedo e meio dormido para chegar a horas a uma reunião que marquei de véspera, para as 8 da manhã. Chego à empresa e nada. Ninguém. Começou ás 10. Espero depois pelas 11 horas combinadas com alguém que me diz quando lhe telefono que já está a caminho. Espero e nada. Ninguém. Só depois de almoço. Vou almoçar e volto mais cedo para esperar por esse alguém que não vem nem atende o telefone. Nada. Só ás 15. Dou depois por mim a fazer o que nao me compete nem me agrada, suando e carregando computadores entre pisos, pois espero por outro alguém que o faria e nada. Já não está ninguém. Só eu.
Dou pela noite chegar e entro por ela fazendo à pressa o trabalho que entretanto esperava por mim na secretária. Esperou o dia todo, desde a manhã.
Mais tarde tocou o telefone e hesitei no convite. Hesitei muito, mas deixei a minha saúde mental decidir e acabei por aceitar. Desliguei o computador e apressei-me para não chegar atrasado. Não gosto de o fazer. Pouco depois me renovo e descanso numa ceia em óptima companhia, ouvindo Tito Paris no Miami Beach. Ao vivo, ele e eu também.
Mas o tempo, esse, chega sempre à mesma hora. E chegou sem atraso o tempo de dormir e de pensar em mais um dia que passou e mais outros tantos que me faltam. Penso no dia de amanhã enquanto não consigo adormecer e faço um esforço adicional para o conseguir, concentrando-me no meu respirar que vai acalmando aos poucos.
Tem de ser, P.! Amanhã não posso chegar atrasado.

24.9.07

Rumo ao Norte

Saímos de Luanda já a manhã era tarde, por volta da mesma hora em que o sol decidiu aparecer. Era meio-dia e tínhamos meio dia pela frente. Seguimos de carro por entre estradas de miséria e musseques de gente e lixo de mais gente, caindo e ensombrando os buracos do caminho. Passamos sobre rios parados imundos e coloridos pelo acumular dos detritos, das sobras do que sobra dos musseques que nasceram mortos nas suas margens. As crianças vão brincando sozinhas escondidas na neblina de um cheiro ardido da lixeira onde vivem. Vi a maior das pobrezas da vida.
Uma vez passando o Cacuaco, a miséria dá lugar à beleza da paisagem, que une através da estrada a terra vermelha a nascente e o mar azul a poente. Surgem os imbondeiros e as palmeiras e os coqueiros e mangais, aqui e ali, em verde esperança, salpicando o horizonte. Mas também aqui a pobreza reaparece e nos acompanha inquietante na viagem, para que não nos deixemos de lembrar onde estamos, ou para nos fazer ver que aqui nunca há sonho sem pesadelo. Nunca. Mais lixo e quase casas e mais gente que nem é gente, vivendo em sobrevivência.
Deixamos a estrada principal que segue para o Caxito e viramos à esquerda até ao litoral, rumo ao mar e ao destino planeado antes na partida: A Barra do Dande.
Andámos 60 Km desde que saímos de Luanda, demorando-nos no percurso por quase duas horas, detidos pelo horror contido do trânsito e da paisagem e pelos buracos que fazem a estrada. No entanto, tudo muda. Chegando à Barra do Dande, e depois da nova ponte que liga a aldeia à outra margem do rio encontramos enfim uma praia sem fim. Deixei-me encontrar por um paraíso selvagem que me ilumina os olhos bem mais que a ténue luz do sol desse dia. E estava um dia quente e calmo, igual ao imenso mar turvo que apareceu majestoso à minha frente. Ao longe, pela praia e até onde a vista pode alcançar só vejo o mar, areia e coqueiros, intemporais, numa comunhão perfeita da Natureza - a única beleza infinda destas terras de Angola. Sem gente... Um resort apenas, com alguns bungalows e tendas e cabanas suspensas sobre estacas em madeira. Hum... e boa comida.
Voltámos ao final do dia. Estamos sempre dependentes da vontade do sol, seja pelo calor que nos oferece, seja pela luz que aqui precisamos para estar seguros. Bem... e também porque estava a ficar sem gasolina no carro e, apesar de aventureiro, essa não é mesmo uma experiência que quero passar por aqui.
Mas cheguei satisfeito ao meu quarto, nostálgico mas cheio de coragem para enfrentar mais uma semana. A verdade é que são mesmo estes os dias que aqui valem a pena.

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