Difícil não é sentir a falta de quem nos faz falta.
É pensar no tempo que falta, no tempo que não volta e sufoca, e nas voltas da vida que o tempo nos dá. Fica a esperança de que o tempo aqui me sorria e me traga a vida de volta.
E tem sorrido...


21.12.07

O fim e o princípio


É mais um fim. Parece mentira mas é verdade...

Mas é pura realidade. Hoje voo para Lisboa, em mais um final esperado com regresso prometido. É por isso um inevitável dia de vivas recordações em pensamento. E lembro-me tão bem de tudo...

Recordo a lua e as estrelas no Lubango. A imensidão do deserto, a estrada, as rochas, as flores e a restante beleza infinda do contraste das paisagens. O começo de tudo.
Recordo o dia de sol em Sangano na adiada viagem ao Sumbe. A areia branca no Mussulo e o seu mar transparente e infinito. Paraíso. Recordo ainda as belas tardes de praia na ilha e o pôr-do-sol de todos esses dias... esse mesmo sol que encontrei na Barra do Dande, onde há dias fui dizer até breve. Deslumbramento.
Recordo as várias noites de cinema autêntico (ou nem por isso) e o magnífico e impensável concerto de Mário Laginha no Belas Shopping. Viajar longe, para longe.
Não esqueço o meu Chill-Out, onde passei num dia uma noite até ser dia, nem o Miami numa noite após tempestade e gin tónico. Noites em branco.
Recordo agora a chuva intensa, em imensa contradição para os meus sentidos e que molhou alguns planos de final de semana, mas que proporcionou outros bem diferentes e inovadores. Trabalhar.
Ficam presentes em mim os jantares como o de ontem 'Naquele Lugar' e em mais outros lugares, entre os quais me lembro que experimentei um restaurante Chinês e um Indiano... e que no dia seguinte estava bem. Sorte. Os jantares de despedida de quem já foi e não vai voltar, e de outros que foram tristes e voltarão felizes. Bem... agora vejo que sou dos últimos a partir...
Recordo ainda os jantares comigo no meu quarto e os outros mais românticos no bar do hotel, em finais de dias que não foram além da rotina. Magnífica vista sobre a baía.
E recordo as pessoas. As que conheci com prazer, as que ajudei de alguma maneira e as outras que me deram apoio e que me fizeram sentir melhor.
Recordo muito e já com saudade aquelas que conheci ainda mais e que com elas criei amizades fortalecidas. Nostalgia que sinto já.
Lembro-me de tudo isto, como se tudo isto tivesse sido vivido apenas num dia só. Ontem. E como o tempo passou tão veloz! Foi ontem sim, e hoje recordo tudo como se tudo fizesse ainda parte de mim, da minha vivência, do meu hoje.
É Natal. Por isso hoje embarco feliz até Lisboa e levo estas inteiras lembranças comigo. Em Luanda deixo apenas metade de mim.
Um Feliz Natal a todos! Até breve...

19.12.07

Porque aqui tudo acontece

Sim, aqui acontece de tudo um pouco.
Esta notícia diz tudo. Irreal.
Estamos em Luanda.
Qualquer semelhança com a ficção é pura realidade.

17.12.07

E Voei...

Como prometi a mim mesmo. Voei baixinho e feliz no sábado, revisitando a belíssima Barra do Dande, uma praia a norte de Luanda, um paraíso descoberto há uns tempos atrás e do qual já tinha muitas muitas saudades. Ou teria ele saudades minhas? Senti isso... Aliás, nem sei sequer se fui eu que o encontrei ou se foi ele que me descobriu nessa altura. E desta vez também... Enfim, foi uma mútua redescoberta num magnífico dia de sol. E de lua também.
Com a mesma lua cheguei no final do dia ao hotel, e nesse final de dia continuei voando, passando pela turbulência da noite em sono profundo. Completo.


Manhã de domingo. Despertei minh'alma na ilha do Mussulo, nas merecidas calmas e transparentes águas da contra-costa, após uma caminhada de duas horas pela areia quente da praia, quase tão ardente como o sol. Nela me deitei depois e adormeci de novo, com o murmúrio das ondas a embalar meu voo. Quase música.
Atravessámos a ilha de novo de volta à costa, e bebemos à chegada da invulgar simpatia de estranhos, que nos receberam para tomar um copo e matar a sede. Gin tónico, claro. Seguiu-se um almoço tardio ainda na ilha e um profundo corte no pé nas águas tranquilas. Nada mau, como preço a pagar. Nada mau...
Mas o magnífico pôr-do-sol cedo nos anunciou a despedida e assim me fiz à pista, meio contrariado. Mas aterrei feliz deste voo. O último deste ano.
Entretanto faltam cinco dias para voar de novo, e será dessa vez bem além do sonho.
Será voar para a minha ansiosa realidade.

14.12.07

Voa voa

O tempo voa. Bem alto e bem rápido. Nem olha para mim. Não me vê.
De hoje a uma semana estarei a voar assim também. Tal como o tempo até lá. Com ele. Ele voa feliz e eu vou feliz voando e vamos os dois felizes, lado a lado com a ansiedade. Resta-me tentar acompanhá-lo com a força que me resta e chegar ao mesmo tempo do que o tempo. Ou mesmo antes, sei lá...
Mas porque hoje é sexta-feira, final de tarde, vou voar também para o fim-de-semana. Vou voar e vou viver aquele meu tempo que não quero que voe. O tempo rasteiro que consigo parar com as minhas mãos e controlar.
Por isso vou voar neste voo nocturno, que parte agora já.
E neste voo nocturno sinto que sou mais leve do que o ar...
Falta pouco. Já sinto o coração a planar.

10.12.07

Cinco minutos

Luanda, 7 da tarde. Noite. Local de trabalho. Superfície. Descanso o meu olhar através da acostumada janela sobre a baía do costume. Descanso a mente também. Sinto uma suave e quente brisa que vem ao meu encontro desejar-me boa noite. Inspiro. Expiro fundo. Flutuo. Cinco minutos.

Pequenas luzes além das luzes dos navios no porto vestem ao longe o hotel Presidente de alto a baixo, transformando-o numa enorme e quase ridícula árvore de Natal.

- É Natal! Recordo-me agora, num estranho misto de alegria e de tristeza. Confuso. Do outro lado vejo mais outra árvore de natal, esta pequena e verdadeira, no cimo mais acima do edifício mais alto de Luanda. Mais luzes aqui e ali por todo o lado brilhando, piscando ou apenas iluminando a época. Sim, é Natal.

Quase que nem sinto o Natal. Sinto que os dias têm passado a correr e tem-me faltado o tempo. Tem-me faltado o tempo para tudo. O trabalho me exige e consome os meus dias e os fins de semana também. Estou exausto.

Hoje é mais uma segunda feira. E foi mais um fim de semana que passou, por onde a chuva passou também mas já partiu (será de vez, desta vez?). Ontem até vi o sol nascer e partir também. E dormi no entretanto, enquanto ele brilhava lá no alto. Descansei.

Conto pelos meus dedos que faltam dez dias para regressar a Portugal. Penso que irei em breve viver o Natal e fechar as portas deste ano. Penso que vou matar as saudades que tenho. Penso depois que volto depois, para um novo início, um último recomeço. Penso que está quase, e assim sorrio de novo.
Suspiro. Fico imóvel por momentos, fixando o meu olhar e sorriso no futuro. Depois desperto, ganho confiança e estalo os meus dedos em sinal de coragem. Bem preciso!
Deixo a superfície. Inspiro por último mais um pouco de muito ar e volto a submergir para o meu mundo dos últimos dias. Está quase!

5.12.07

Vim para ficar


Vim para ficar. Parece ser o que ela me quer dizer... Recebo-a feliz todas as noites, pela janela do meu quarto, mas de dia sou eu quem dá o primeiro passo e a visita por acasos momentos, beijando-a quando me cruzo com ela nas ruas que também cruzo. Uma relação com uma semana, quase incessantemente. Quente. E tudo começou por acaso... Eu confesso que nem fiz nada por isso. Não esperava. A verdade também é que já nem me lembro como tudo começou... só me lembro de um céu rosa vivo, mesmo antes de a ter visto de relance pela primeira vez. Se já a tinha visto mais vezes? Sim, foi logo o que pensei... E creio mesmo que sim. Bem, mas ela aproximou-se de mim logo de uma forma muito intensa - no início é sempre assim com todas as coisas que nos surgem de surpresa. Surpreendeu-me a mim e a toda a gente que me rodeia. Mas agora tudo é mais doce... sim, mais duradouro também. Tem vindo todos os dias e ficado por longos minutos. Cada vez passa mais tempo comigo e agora até já corre comigo na marginal ao final de cada dia. Por vezes fico mais feliz, outras mais triste... tem dias. Uma vez me lembro que até me chateei seriamente quando ela me incomodou sem eu querer durante um almoço de esplanada, o que me obrigou a afastar-me um pouco. Decidi-me forçosamente e disse que não a queria mais. Estava farto, pois tudo tem uma hora e um momento para acontecer. Mas depois pensei melhor e desculpei-a, abraçando-a em plena rua. No fundo, temos uma relação igual a tantas outras... Um misto de emoções. Tentativas de equilíbrio. Assim vos digo que faz hoje uma semana que o fazemos todos os dias, e hoje já é quase rotina e até estranho quando acordo e não a vejo ao meu lado. Mas sou feliz sim. E ela também, pois volta sempre depois de cada despedida e de cada beijo molhado. Sim, somos felizes.

Chuva. Faz hoje uma semana que chove em Luanda.

O sol já quase nem o recordo... não o vejo por aqui desde a mesma altura. Dizem as boas línguas que o sol e a chuva partilham uma amizade colorida, e que sempre que se juntam se amam e enchem o céu dessas cores dessa amizade. Mas é raro por aqui... Devem estar chateados. Entretanto já sei que o sol voltará em breve. Sim... vai voltar. Deixou aqui o seu calor.

3.12.07

Despertar


http://expresso.clix.pt/gen.pl?p=stories&op=view&fokey=ex.stories/180043



Aqui tão perto de mim. Aqui mesmo ao lado, mas para além do mal que se vê nas ruas por onde passo e do pequeno mundo que observo através da minha janela.
Isto para mostrar que Angola infelizmente ainda é igual a muitos outros países no que respeita ao respeito pelos direitos humanos.

Para vos mostrar também que o silêncio também aqui ainda é a palavra de ordem. Calar ou pagar por isso.

Por isso julguei que devia divulgar a história aqui, para que nada nem ninguém se silencie. Em respeito pela liberdade de imprensa e de opinião. Sobretudo muito respeito e admiração por quem tem a coragem de abrir para o mundo uma janela que ninguém quer espreitar.

Para o António, um grande abraço.

27.11.07

A sério? Epá...

Ontem mesmo chegou até mim esta notícia.
É. Luanda é a cidade mais cara do mundo.
E eu penso: - Mas será mesmo? Penso nisso logo de manhã, enquanto pago 3 Usd por um café no hotel, depois de uma tosta mista e de um sumo qualquer que paguei antes com 20 Usd.
Será mesmo? Mantenho esse pensamento à hora de almoço, enquanto tento comer alguma coisa à pressa no restaurante mais barato e apressado dos arredores, e onde pago também à pressa 30 Usd pela refeição. Será mesmo? À tarde não lancho e por isso não penso nisso. Mas chega a noite e janto num local mais confortável, e com mais tempo e continuo com o mesmo pensamento enquanto tiro do bolso uma nota de 50 Usd para pagar o jantar. Chego ao parque do Hotel e o segurança (- Tá seguro, chefe!) olha-me com maus modos porque lhe dou apenas 100 Kz. Contando por alto os Kuanzas que ficaram arrumados nos bolsos dos miúdos que encontro durante todo o dia, chego a contar 10 Usd. Isto tirando os jornais que não leio, mais os cafés que não tomo e a água que não compro... enfim, todo um dia de privações.
Eis que me deito à noite no meu quarto de 300 Usd e chego a uma conclusão finalmente: Luanda? A mais cara? Naaaa! Epá, vê-se logo que esta gente que faz estes estudos não percebe nada disto. Vocês sabem onde é que é caro, mas mesmo caro? Mas caro tão caro que até chateia? É em Ermesinde. Acho...

26.11.07

Fico Feliz

Sim, fico feliz. Muito feliz por saber que este meu 'cantinho' ajuda e dá alento a muita gente que vem em breve para Angola, ou mesmo a quem já anda por cá. Procurando informações, curiosidades, algum conforto ou motivação, o que é certo é que vou recebendo e conhecendo novas pessoas que, tal como eu há uns meses atrás, vêm sentir Luanda pela primeira vez. E procurando Angola, encontram-me aqui.
Hoje recebi mais um e-mail. Emocionou-me, pela escrita sentida e tremida. Pelas frustações contadas sentidas e vividas à chegada. Pelo desânimo incontido dos primeiros dias e pela ansiedade contida dos dias que virão. Pelas noites não dormidas e pela esperança sonhada de que tudo passe e melhore. Um dia. Em breve.
Arrepiei-me até, por compreender tão bem este sentir que foi também o meu quando aqui cheguei. E parece que já foi há tanto tempo... Hum... É bom sinal.
Gostei de saber que de alguma forma o meu blog pôde dar a alguém algum conforto e companhia. Alguma ajuda. Ajudou talvez a compreender um pouco os extremos que Luanda nos oferece e nos obriga a partilhar todos os dias. O bem e o mal que aqui vivem na mesma cidade, no mesmo bairro, na mesma casa, no mesmo momento. Ajudou talvez a ver de outra forma este mundo à minha volta. O bem que prevalece sempre sobre cada coisa. O bem que encontramos escondido atrás de cada sombra. Esse bem que só encontramos com a amizade de quem nos rodeia.
Senti sobretudo que ajudei a sentir que ninguém está sozinho neste mundo... e muito menos em Luanda. A verdade é que todos passamos pelo mesmo... embora nos possa custar de forma diferente. Mas ultrapassa-se, com o tempo. Sim, ultrapassa-se. Aprende-se a gostar. Aprende-se a viver. E o segredo é simples, muito simples. O segredo é nunca estar só. Sempre. Os amigos são o melhor bem que se pode ter aqui. De longe... são mesmo.
Por tudo isto fico feliz. Por tudo isto ganho ânimo também. Faz-me bem e dá mais sentido ainda ao que escrevo.
Por vos poder ajudar, muito obrigado a todos.

23.11.07

Life!

Meio de uma tarde com muito trabalho e muito pouca vontade. E sono. Muito sono.
Depois passa por mim esta música e tudo passa depois. Acordo, ganho ânimo. Desperto e sorrio.
Pela janela vejo o sol que brilha como nunca. Não o sinto, mas lá fora está um calor que não se aguenta. Observo a baía ao fundo, que me acalma com a sua calma beleza.
Sinto-me bem. Sabe tão bem... Como uma música nos transforma o dia, assim.

É meio da tarde. Partilho assim um pouco desta minha felicidade.

19.11.07

Fugir


Corro pela noite na marginal. Noite cedo e noite dentro. Sinto no rosto a brisa quente sempre presente no final de cada dia. Sinto no corpo molhado a chuva quente que flutua em rosa púrpura no céu. Sinto a baía no olhar ardendo, o mar olhar adentro que me inunda com todo o seu esplendor. Sinto a luz que me observa e vigia e me acompanha através da névoa que me separa dos edifícios que passo, dos carros que circulam e do olhar das pessoas que passeiam.
Eu. Pensamento presente, cortante. Vagueio. Respiração que me falta. Recuso. Penso e não quero. Apresso os meus passos e sinto que assim não penso. Não penso e fico alheio. Fico enevoado. À margem. Fujo e me ausento. Fujo de mim e consigo. Apresso os meus passos. Vejo-me distante, ao longe. Desistindo.
Depois páro. Sinto que desperto novo. Vivo. Renovado.
Entro cansado no quarto que me espera e me deito vazio ao meu lado. Noite dentro lá fora. Sorrio. Sinto que venço. Finalmente adormeço.

13.11.07

Tanto, mas tanto...

É tanto o que tenho para dizer, para contar.... Seriam precisas mais de mil palavras.
Mas afinal eu sei que apenas é necessária uma: Apaixonante!
Adorei o Lubango. Amei. A antiga Sá da Bandeira invadiu-me a alma e o coração de uma forma que nem eu sei explicar. Foi tão intensamente forte! Compreendo agora a paixão que Angola transmite, a quem aqui veio e ficou, ou a quem veio para ficar. Compreendo agora que Angola não é só Luanda, felizmente! Aliás, Luanda não é Angola. Ponto.
Mas vou começar pelo princípio: Sábado, 4 horas da manhã, Aeroporto 4 de Fevereiro em Luanda - Voos domésticos. Fico desiludido porque afinal o aeroporto nem é mau de todo. Tem sala de espera, com ar condicionado e um bar. Bom ar. Estranho, tinham-me dito tão mal! Seguiram-se aqui 4 horas de ansiedade e de sono pelo avião que só partiu depois das 8 da manhã. Outra desilusão: o avião afinal era novo!?! Assim não! Eram condições a mais. Inesperadas! Mas o destino que me esperava era Lubango. Ainda mais inesperado.
Chegamos lá a meio da manhã. Tarde. Longa se torna a espera até todos estarmos reunidos e partir enfim para uma casa que teríamos ainda de procurar... E procurámos.
Lubango fica num vale, entre montanhas. A sensação que nos dá é de que estamos em Portugal, numa vila serrana qualquer, nas Beiras. Protegido e escondido entre as montanhas, como se qualquer chegada aqui fosse uma grande descoberta para quem a encontra. Fascínio quase irreal.
As ruas largas limpas e decoradas por casas baixas e coloridas. As pessoas. As crianças brincando na rua, em mistura de cores numa única cultura. Sem raças nem distinções. Os edifícios principais, coloniais e monumentais que surgem na ampla praça da cidade, com fontes luminosas entre os arrumados passeios e as árvores de fruto. Jardins. Tudo isto me dá a perfeita sensação de que descobri, encontrei Portugal em Angola. E encontrei-me a mim mesmo também. Sim.

Chegamos enfim à casa. Encontrámo-la por fim. Enorme casa na serra. Na Senhora do Monte, com uma grande varanda sobre toda a cidade. Local de contemplação. Descanso aí a vista e também o corpo, da viagem e da ansiedade. Respiro um pouco então… de emoção. Ainda e depois. Irrealidade e liberdade.
Subimos à tarde pela serra, nove pessoas com uma “Hiace” (aqui lê-se tal e qual como se escreve) por montes e vales e rochas, até à mãe das contemplações. A Tundavala. A Tundavala é uma fenda da mãe natureza, a dois mil metros de altitude, e que nos assombra com uma visão estonteante. Vertiginosa para os sentidos. Silêncio. Calma. Religioso até… É um corte quase perfeito na rocha, a direito e a pique, por dois mil metros. Lá em baixo, muito baixo, até onde a vista pode alcançar, é o perfeito deslumbramento. O horizonte aos nossos pés, bem lá em baixo. Incrível!


O dia tornou-se curto, muito curto, com a noite que chegou apressada. Jantamos em harmonia no Huíla Café, bem no meio da cidade e respiramos mais um pouco, em quase suspiros de olhos fechados. É tão bom o nosso sentir… E a ansiedade continuava desperta em nós, por mais um dia, mais e muitos momentos de deslumbramento.
No dia seguinte seguimos cedo o caminho longo para o mar, em direcção ao Namibe. Antes paramos para redenção no Cristo Rei, que abraça toda a cidade do alto da serra. E que desejo o meu, de a abraçar também!


Continuamos depois a viagem pela estrada quase deserta, chegando pouco depois à Serra da Leba. Serpente que desce a colina em perfeita comunhão. Sim, a foto do post anterior… mais palavras para quê?
Depois da serra a estrada deserta chega ao deserto. Imponente, mesmo. Paisagem quase lunar, e bem mais perto do sol. Do céu! De mim… Beleza pura, sensação de liberdade. Vontade de estender os braços e gritar bem alto os nossos sonhos e desejos. Fascinante. Silêncio de novo, com olhos bem abertos de contemplação. Inesquecível.

Chegamos ao Namibe. Cidade calma, arrumada e limpa, bem junto à praia. Com ar de praia. Linda. Mergulhamos e bebemos um pouco mais desta sensação de estar tão longe de tudo, e ao mesmo tempo tão perto de nós. Um almoço, um passeio pelas praias ali perto, um sol que se esconde depois entre as nuvens. Um adeus de repente, um regresso prometido. Voltamos enfim ao Lubango, revisitando o deserto que o sol escolheu para dormir.
A noite trouxe as estrelas que nos fizeram companhia. Testemunhas. E tantas estrelas! O céu inteiro! A elas pedi desejos eternos, outros fugazes, mas desejos sinceros. E na varanda de casa me fui perdendo, ou encontrando, inspirando toda a cidade que dorme aos meus pés. Visão presente, em passado e futuro reunidos. Começo assim a sonhar ainda antes de adormecer. Adormeço depois a sorrir. Cansado, mas a sorrir.

Segunda-feira foi dia de regresso. Atribulado e triste pelas sensações que ficam em nós mas que se deixam de viver, assim. Não só pelo que se deixa e se viveu para trás, mas sobretudo pelo regresso a Luanda, pelo que se reencontra e que aos nossos olhos nos parece ainda mais triste e degradante. Choveu no regresso, como se Lubango chorasse o nosso adeus, tal como nós choramos a nossa despedida, como o final das emoções vividas. A vontade era de ficar… Lubango. Mão no peito, olhar no infinito. Mais umas horas, uns dias, quem sabe. A vontade é de regressar, por mais uns dias, umas semanas, talvez. A vontade real é talvez de ir e ficar. Vida inteira, quem sabe. Fica a vontade.

Sim, foram momentos vividos que ficarão em mim para sempre. Sim, foi um deslumbramento para a vida e que estará sempre presente. Sim, para sempre. Ficaria lá para sempre. Quem sabe? Só Deus sabe…

Bem, cheguei bem perto das mil palavras afinal... E voltando de novo ao resumo inicial, preciso afinal de mais duas palavras: Mágico. E Eterno.

9.11.07

Eu vou, Eu vou...

... Para o Namibe eu vou!
Rumo ao Sul mais a sul. Rumo ao sol à praia e ao deserto ali tão perto. Lubango e Namibe.
Detalhes? Não sei, confesso... Acho que vou num suposto avião pela madrugada. E com bons amigos. O resto não sei. Mesmo. Nem tenho de saber... não importa... Dizem que é esse o espírito! E eu concordo. Três dias de pura e inconsciente aventura que têm tudo para correr bem, porque tudo o que é incerto dá certo. Ah... três dias sim! E três porque é feriado na 2ª feira, pelo dia da Independência de Angola. Hum... Sendo assim, viva a Independência! Acho...
Vai ser bom, muito bom. Aguardo ansioso pelo passar das horas que faltam e espero que tardem e se demorem as horas em que estarei por lá. Muito longe de Luanda, muito perto de mim mesmo. Serei eu vivendo-me.
Depois conto as aventuras e as emoções, quando regressar bem triste pelo regresso. Quer dizer... se regressar... (piada, só).
Ah, mas sei outra coisa quanto à viagem... É que amanhã irei passar por aqui:

É lindo... não é?

6.11.07

Voltei, voltei...

...Voltei de lá! Ainda ontem estava em casa e agora já estou cá. (não sei porquê, acho que esta frase daria um espectacular refrão de uma música. Pimba).

E cheguei sorridente e estranhamente bem disposto numa linda manhã de verão. Saí radioso do simpático avião 'libanês' (?), sob um sol radiante crescendo sobre esta Luanda brilhante e limpa vista lá do alto, como nunca, ao calmo sabor das sete da manhã.
O cheiro. As pessoas. A cidade que desperta. Luanda intacta. Inspiração.
Boas vindas não tão bem vindas, pensei, enquanto encontrava algo que me mantivesse a calma e paciência necessárias para me manter de pé por três horas na chegada ao aeroporto.
Passaporte e carimbo. Carimbo no passaporte. Custa tanto assim? Três horas.
E três horas se passaram e outras duas se seguiram, tentando desbloquear na alfândega uma encomenda que trouxe comigo. Somam cinco. E taxas alfandegárias a pagar. E mais duas horas ainda no meio do trânsito infernal, para chegar ao Hotel. Somam sete.
- Welcome back!.... disse-o tantas e tantas vezes neste dia! Mas afinal que tem Luanda de bom?
Mas tem sim... Sei que tem. E vou buscando na memória as memórias que guardo de tudo o que sinto e gosto. Ou que já senti e gostei. Aqui. Prendo-me a isso e desligo do resto. É mesmo assim.
Sinto-me bem depois, e depois de dormir um pouco. Regresso enfim a esta aventura de sentidos incompreendidos, de explicações inexplicáveis. E é tão difícil explicar o sentir...
Mas é junto à praia, terminando este meu dia, que percebo. E percebo que regresso enfim, de novo. E de novo sinto que ganho alento. Força e coragem. Alimento-me disso e penso: Afinal até consigo ser feliz aqui. Mesmo assim...
Farei por isso.

18.10.07

Recordações

Último dia. Dia cinzento e de chuva que não se sente. Dia de recordações.
Faço hoje, no tempo que me vai restando durante o dia, um balanço sentido destes últimos dias. Destas semanas que aqui passei e de tudo o que senti e vivi, tentando apenas sobreviver. Apenas.
Recordo-me da praia. Dos dias das tardes de praia em Cabo Ledo e em Sangano. O sol. A beleza pura e intacta da Barra do Dande, para onde fugi por três vezes. E outras mais o faria, com tempo. A linda viagem a Porto Ambriz, ou quase, passando pelo Caxito e por estradas e aldeias e picadas incertas com rumo a praias quase desertas e paisagens de incontável beleza. A ilha do Mussulo. A liberdade. A nostalgia incontrolável de cada regresso em cada viagem.
Recordo os jantares Naquele Lugar, ao som da música quase mágica que me transporta deste lugar para outros lugares. Os petiscos lusos na Tendinha ao final do dia, onde as conversas são como as cer(v)ejas - há sempre lugar para mais uma. Lembro ainda outros jantares, inesperados e outros não, no Miami, no Ponto Final, no Embaixador, na Vila Alice e outros mais que, de tantos, não consigo mais mencionar. Os almoços de final de semana na ilha, na praia. Numa cadeira de praia. A paz.
Recordo também os momentos menos bons... A minha ausência constante nos dias mais importantes de uma vida. O meu aniversário, os casamentos dos meus melhores amigos e os aniversários de quem mais me importa na vida. Falhei. Recordo ainda o momento e a noite em que mudei de hotel muito à pressa, com as minhas coisas amontoadas arrumadas por outros. Hoje até consigo sorrir disso, é um facto. Hoje sim.
Recordo os dias de trabalho. O tempo e a paciência que muitas vezes se consome e me consome. Ainda o trabalho e outras alegrias das coisas boas e menos boas, geridas pelas expectativas. As minhas sempre baixas. As consequentes surpresas. Sim, alegrias.
Mas recordo sobretudo os amigos. Os que me apoiaram e acarinharam mesmo longe, dando-me a motivação nos momentos mais tristes. Os outros que aqui reencontrei e os que ganhei, com uma força imensurável e que nunca me deixaram sentir só. É verdade, nunca me senti só.
Hoje sinto a felicidade crescente que me tomou de assalto inesperado nestes últimos dias. Hoje conto os momentos que passaram da mesma forma que conto as horas que faltam para regressar a casa. Com a mesma alegria. Olho o passado com nostalgia e o presente em ansiedade. Constante e crescente.
Por tudo isto amanhã parto feliz. Pelo que vivi estes dias e pelo que viverei nos dias aí.
Por tudo isto, Luanda, até breve.

15.10.07

O Quase Final

Este foi o meu último fim de semana aqui... antes de ir de férias por quinze dias. Depois volto, claro... Mas com dias assim deixo de pensar nos dias que faltam até ao meu adeus, e deixo de julgar difícil o meu regresso depois... Sei que não vai ser muito difícil.

E este foi mesmo um fim de semana 'daqueles'. Na sexta-feira passei no Chill Out uma das melhores noites (hum... a melhor que me lembro...) das minhas noites em Luanda. Muito muito bom... com Buraka Som Sistema - não gosto, mas aqui é diferente, e por isso gosto - a fazer a festa. Uma festa com muito gin tónico à mistura e suavemente misturado pela boa companhia.

Sábado foi dia de praia no Caribe e de dor de cabeça ao acordar. Já anotei: Guronsan - não esquecer! Foi mesmo assim um óptima tarde de sol com um entardecido almoço junto à praia. Açorda de marisco com gin tónico - é uma boa combinação, acreditem. Ah, a propósito: - Mãe, não bebo cerveja há quinze dias seguidos! Juro. Neste dia a noite entrou bem tarde com um jantar bem romântico a três, no Cais de 4, à luz das velas e caindo sobre a vista magnífica de Luanda sobre a baía. Decidimos depois ir 'beber um copo - mas um só!' novamente ao Chill Out, o que acabou por se tornar em mais uma noite longa... bem longa... irresistível e inesperada, com os copos que se seguiram atrás desse 'um só'. Vários. Mas portei-me bem, ok? Sempre bem.

Domingo foi um novo dia. Acordar cedo para um outro destino: Ilha do Mussulo. Hum... já escrevi a parte do Guronsan...? Ok... tenho mesmo de trazer. Fomos até ao Barssulo, um pequeno paraíso a sul, sítio ideal para um domingo assim. Não estava sol, nem esteve o dia todo, mas eis que ele brilhava em mim, tão perto que estava. E dormi, adormeci... relaxei e desfrutei, em autênticas camas (são mesmo!) na praia. Dias assim dão mesmo que pensar... muitas vezes. Isso realmente... Hum... dá que pensar, só isso.

O dia acabou por acabar nostálgico, mas feliz, como eu me sentia, após um óptimo jantar de amigos. E cartas. (sim, aqui joga-se espadinha!). Acabei assim o dia meio acabado com o cansaço espelhado no rosto e o pensamento invadido pela vida. A minha vida. Tudo aqui vale a pena, pela experiência vivida, pela beleza das coisas belas, e pelas amizades que aqui ganham um outro sentido, uma outra força. Adorei.

Será que estou mesmo a gostar muito disto? Aa... talvez sim...

Mas só talvez.

Levitação

Porque hoje me sinto assim.
Está quase.

13.10.07

Parabéns

Desculpa por hoje não estar contigo.
Desculpa abandonar-te assim neste dia e em todos os dias especiais. Todos estes dias.
Desculpa a solidão e as noites que choras por mim, olhando para a minha ausência ao teu lado.
Desculpa as palavras que digo e as outras que nem sempre digo e que esperas ouvir.
Desculpa o parar do relógio da nossa vida e dos nossos planos em comum.
Desculpa estas minhas desculpas, e a tristeza dos dias tristes que passas sem mim.
Meu amor... desculpa. Muitos parabéns.

12.10.07

Há Que Tempos...

Não tenho tido tempo nenhum, como vêem...

Acho que nunca estive tanto tempo assim, sem tempo. Passou uma semana inteirinha, a bom correr. E uns dias ainda além disso, a bom andar.
Mas no fundo, tudo tem corrido bem. Até mesmo a ausência de tempo. Continuo no Hotel Presidente, e já me vou habituando à nova casa... Ou melhor: casinha. O meu quarto é muito pequeno, apesar de simpático. Os elevadores, esses, são para rir mesmo. Ao princípio desesperava, mas agora já me rio. Demora-se mais que uma eternidade entre o meu 17º andar e o hall de entrada, em pequenos cubículos enlatados que parecem mesmo latas de conserva - só que ainda mais pequenos. As portas de acesso ao elevador são autênticas assassinas em série. Basta descuidarmo-nos um pouco e ficamos esmagados entre elas. É lindo! Apesar disso, o que é certo é que se come bem melhor que no outro hotel, e o restaurante e bar são ambientes muito agradáveis e... hum... românticos até.
Tenho agora um "carrinho" para fazer as viagens entre o 'novo' hotel e a empresa, o que se torna em mais umas grandes aventuras em cada dia que passa. Estou um perfeito candongueiro! Estou é já com receio de como vai ser em Portugal...
Por falar nisso... falta apenas uma semana! O tempo tem voado, é verdade... e sei que o que falta passará ainda mais rápido por mim. Tenho a certeza.
Vou-vos dizer... Apesar de tudo o que tem acontecido, hoje vos digo que estou a começar a adorar isto... Sim, é perigoso. E agora costumo dizer: - O que custa são os primeiros 4 meses, depois aprendemos a gostar. Ora, os 4 meses já passaram... e exactamente ontem.
Mas sou suspeito também... porque hoje é sexta e estou com uma vontade 'daquelas' de sair destas quatro paredes para onde quer que seja, e aproveitar da melhor forma o último fim de semana que me resta.
Por isso esperem um pouco, que eu já volto.

11.10.07

A Factura


Já vos falei do difícil que é conseguir aqui uma factura nos restaurantes...
Pois bem, esta foi a mais fácil. E original, sem dúvida. Foi na Barra do Dande, na Dona Alice. Reparem no "Obrigado e Volte Sempre", em letras bem redondinhas. Um mimo!
Será que dá para o IRS? Hum...

4.10.07

Um Dia Especial

É hoje. Faz quatro anos que tive todo o meu mundo à minha volta. Lembro-me que foi um dia de sol, depois de muita chuva antes e depois, nos dias que se seguiram. Um dia lindo de sol. Eu era a segunda pessoa mais importante da festa, logo depois da pessoa mais importante da minha vida inteira: a minha esposa. Faz hoje 4 anos que me casei. Um dia único, cheio de boas recordações que agora revivo sozinho, em pensamentos.
- Amor... são 4 anos... não são? Desculpa... e parabéns!
Também hoje é um dia especial para a pessoa que mais admiro neste mundo, e que mais quero agradar e suceder em seus passos nesta vida: o meu querido pai faz hoje 67 anos.
- Parabéns, meu pai... E que venham muitos mais anos, bem felizes, e que eu os possa ver e partilhar consigo.
Nesta noite que passou dormi noutro hotel... Fui literalmente 'expulso' do Hotel Trópico e mudei-me de malas e cabides e bagagens (forradas a plástico do hotel...) para o Hotel Presidente. "- Estamos em Angola... Aqui é assim." Foi a resposta que recebi, antes e depois das desculpas que recusei aceitar.
Nesta noite passei a noite em claro, pegando no meu baú de memórias e na minha vida presente. Comparando-as incomparáveis, junto à janela do meu quarto, as memórias serviram-me para tomar mais uma decisão da minha vida: partir - já amanhã no primeiro avião para Lisboa - ou ficar... mais uns dias. Ao longe vejo um novo dia nascer, o mesmo trânsito crescer e as pessoas minúsculas que aos poucos vão preenchendo o pó das ruas que lá em baixo se confundem. À minha frente, no pensamento, uma rosa dos ventos. Qual o destino? Tinha isso para decidir, nesta minha noite de encruzilhadas. Não dormi mesmo nada. Mas valeu a pena. Saio pela manhã decidido a partir. Era essa a minha vontade... Tinha de ser. Não podia aceitar!
Acabo depois por hesitar no caminho... e inconscientemente depois aceitei e fiquei. Fiquei e estou ainda aqui. Mais uns dias, somente... Mais uns dias.
Foi assim, como vêem, um dia ainda mais especial... Para o bem e para o mal. Mas para o ano espero recordá-lo com um grande sorriso nos lábios, com muita alegria no coração e, sobretudo, estando bem mais perto de quem amo. Assim espero...

30.9.07

A Barra do Dande

Domingo. Voltámos de novo e ansiosos às magníficas praias a norte da Barra do Dande. Passámos pela mesma confusão do trânsito que se estende desde Luanda por entre a incómoda confusão entre o lixo e as casas e as pessoas, dispostas para um retrato que é bem fiel à pior das misérias. Mas chegámos, e logo varremos toda miséria do nosso olhar com a mais pura e bela das paisagens. Lindo!
E foi um dia espectacular... além de algum bronze ganhei de novo um ânimo de ouro para enfrentar os dias que se seguem.
Bem, mas para mais alguns pormenores... podem continuar por aqui.

29.9.07

O Segundo Casamento

Hoje mesmo foi o dia do meu segundo casamento.
Ok... não me interpretem mal: hoje foi o dia do segundo casamento ao qual não pude ir, por aqui estar em Luanda. Mais um grande amigo que não pude neste dia ver nem desejar com um abraço sentido toda a felicidade do mundo. Como sempre. Mais um dia de partilha que não pude ter nem partilhar, com todos os outros amigos que fazem parte do meu mundo. Todos... Só eu não estive presente.
E como custa estar ausente! Nestes dias sinto mesmo a vida passar ao meu lado e o tempo passando também, perdido e desperdiçado. Sinto a falta da alegria e da amizade construída em tantos anos e tão bons momentos... Por momentos hoje senti-me arrependido.
Mas enfim... todo este meu dia passei-o lá. Com eles. Vivendo imaginando a sala e a gente, os noivos, as mesas repletas, a música, os amigos de sempre, o passar das horas e as nossas conversas que de tão vezes contadas já se tornaram histórias. Vivi um pouco destes momentos divinos, inesquecíveis e que para sempre serão contados, tornando-se novas histórias, de uma grande família.
Não estive lá... Mas tentei! E fi-lo com o pensamento e muita imaginação. Não resultou muito, pois passei o dia triste e a minha alma não mente - nada substitui o estar realmente presente. Mas para ti, meu irmão, aqui deixo um grande abraço. Neste dia tive-te sempre, bem pertinho do coração.

28.9.07

O Cinema

Hoje fui ao cinema ao Belas Shopping.
Sim... Estou em Luanda, claro! E o Belas Shopping é um centro comercial, inaugurado há pouco mais de um ano, e com muito bom aspecto. Quase parece que estamos em Portugal, e por momentos até tenho de pensar duas vezes para não pensar que sim. É um espaço agradável amplo e fechado, com lojas chiques e caríssimas, com um hipermercado e com um espaço de restauração onde se pode encontrar a Portugália ou outros restaurantes de todo o mundo. Todo... menos de Angola.
Bem, mas voltando ao cinema: numa das seis enormes salas do espaço que pouco tem a ver com Angola, decidimo-nos por ver o filme que mais tinha a ver: O Último Rei da Escócia. Sim, eu sei... já está aí em DVD, mas por cá ainda é o que se encontra de mais actualizado no mundo do cinema. E gostei. Muito! É daqueles filmes que dá que pensar, sobretudo a quem se decide a vir para África, ou a não vir. No principal papel vemos brilhando Forrest Whitaker, dando vida a Idi Amin Dada, antigo e controverso presidente do Uganda. E o Uganda está aqui tão perto, na distância e no tempo...
Aqui damos um sabor bem mais especial a estas coisas... A verdade é que o filme, sendo ficção, retrata uma história bem verdadeira e escondida dos olhos da humanidade durante muito tempo. Só consegui adormecer depois de pensar que em Angola isso seria impossível de acontecer nos dias de hoje. Tudo aqui está, afinal, à vista de toda a gente. Do mundo inteiro, ou para quem quiser ver.
A quem não viu ainda... recomendo.

26.9.07

Dia de Atraso

Acordo bem cedo e meio dormido para chegar a horas a uma reunião que marquei de véspera, para as 8 da manhã. Chego à empresa e nada. Ninguém. Começou ás 10. Espero depois pelas 11 horas combinadas com alguém que me diz quando lhe telefono que já está a caminho. Espero e nada. Ninguém. Só depois de almoço. Vou almoçar e volto mais cedo para esperar por esse alguém que não vem nem atende o telefone. Nada. Só ás 15. Dou depois por mim a fazer o que nao me compete nem me agrada, suando e carregando computadores entre pisos, pois espero por outro alguém que o faria e nada. Já não está ninguém. Só eu.
Dou pela noite chegar e entro por ela fazendo à pressa o trabalho que entretanto esperava por mim na secretária. Esperou o dia todo, desde a manhã.
Mais tarde tocou o telefone e hesitei no convite. Hesitei muito, mas deixei a minha saúde mental decidir e acabei por aceitar. Desliguei o computador e apressei-me para não chegar atrasado. Não gosto de o fazer. Pouco depois me renovo e descanso numa ceia em óptima companhia, ouvindo Tito Paris no Miami Beach. Ao vivo, ele e eu também.
Mas o tempo, esse, chega sempre à mesma hora. E chegou sem atraso o tempo de dormir e de pensar em mais um dia que passou e mais outros tantos que me faltam. Penso no dia de amanhã enquanto não consigo adormecer e faço um esforço adicional para o conseguir, concentrando-me no meu respirar que vai acalmando aos poucos.
Tem de ser, P.! Amanhã não posso chegar atrasado.

24.9.07

Rumo ao Norte

Saímos de Luanda já a manhã era tarde, por volta da mesma hora em que o sol decidiu aparecer. Era meio-dia e tínhamos meio dia pela frente. Seguimos de carro por entre estradas de miséria e musseques de gente e lixo de mais gente, caindo e ensombrando os buracos do caminho. Passamos sobre rios parados imundos e coloridos pelo acumular dos detritos, das sobras do que sobra dos musseques que nasceram mortos nas suas margens. As crianças vão brincando sozinhas escondidas na neblina de um cheiro ardido da lixeira onde vivem. Vi a maior das pobrezas da vida.
Uma vez passando o Cacuaco, a miséria dá lugar à beleza da paisagem, que une através da estrada a terra vermelha a nascente e o mar azul a poente. Surgem os imbondeiros e as palmeiras e os coqueiros e mangais, aqui e ali, em verde esperança, salpicando o horizonte. Mas também aqui a pobreza reaparece e nos acompanha inquietante na viagem, para que não nos deixemos de lembrar onde estamos, ou para nos fazer ver que aqui nunca há sonho sem pesadelo. Nunca. Mais lixo e quase casas e mais gente que nem é gente, vivendo em sobrevivência.
Deixamos a estrada principal que segue para o Caxito e viramos à esquerda até ao litoral, rumo ao mar e ao destino planeado antes na partida: A Barra do Dande.
Andámos 60 Km desde que saímos de Luanda, demorando-nos no percurso por quase duas horas, detidos pelo horror contido do trânsito e da paisagem e pelos buracos que fazem a estrada. No entanto, tudo muda. Chegando à Barra do Dande, e depois da nova ponte que liga a aldeia à outra margem do rio encontramos enfim uma praia sem fim. Deixei-me encontrar por um paraíso selvagem que me ilumina os olhos bem mais que a ténue luz do sol desse dia. E estava um dia quente e calmo, igual ao imenso mar turvo que apareceu majestoso à minha frente. Ao longe, pela praia e até onde a vista pode alcançar só vejo o mar, areia e coqueiros, intemporais, numa comunhão perfeita da Natureza - a única beleza infinda destas terras de Angola. Sem gente... Um resort apenas, com alguns bungalows e tendas e cabanas suspensas sobre estacas em madeira. Hum... e boa comida.
Voltámos ao final do dia. Estamos sempre dependentes da vontade do sol, seja pelo calor que nos oferece, seja pela luz que aqui precisamos para estar seguros. Bem... e também porque estava a ficar sem gasolina no carro e, apesar de aventureiro, essa não é mesmo uma experiência que quero passar por aqui.
Mas cheguei satisfeito ao meu quarto, nostálgico mas cheio de coragem para enfrentar mais uma semana. A verdade é que são mesmo estes os dias que aqui valem a pena.

21.9.07

Falta um Mês...

Apercebo-me feliz de que o tempo tem passado por mim a correr nestes últimos dias. Os dias parecem-me sempre curtos e sinto que não consigo gerir as horas dos meus dias da melhor forma. Entretanto as minhas noites caiem longas e contínuas e se alongam em insónias de preocupação e de pensamentos distantes.
Continuo cansado e nem sei se é do trabalho, das noites não dormidas ou apenas do tempo que passa. Sinto mais que será do tempo que já passei aqui. É muito. Mas entretanto vou continuando a riscar os dias que passam e a contar aqueles que faltam. Hoje, na minha parede já muito riscada chego à conclusão de que entre os riscos do tempo apenas falta um mês para matar a saudade. Um mês apenas! Ganho então mais ânimo e penso que com este tempo que foge irei riscar rapidamente os dias que faltam. Num instante, não duvido.
Contudo, há sempre os dias e as noites dos riscos que sobram e que gosto de os riscar bem devagar, recordando-os. Quanto a esses, só me resta aproveitá-los bem. E hoje vou fazer isso, claro! Enquanto sei que chove em Lisboa, irei compensar nesta noite quente as noites brancas que tenho passado em claro. Chill Out.

19.9.07

Ainda a Praia

Muito além da praia, estes dias ficaram marcados por uma música que nos invadiu, que nos arrastou e acompanhou sempre para todo o lado. Aqui e para perto de quem gostamos, tão longe que deles estamos na distância. Aqui está, pertinho do coração.

18.9.07

Praia, Doce Praia

Pareceram um dia apenas. A verdade é que foram três os dias deste fim de semana, alargado e completo mas curto nas horas e na originalidade. O que fiz? Praia, mais praia e… mais praia. Três dias de mar, sol e areia. Apenas. Ah… e lagosta, até fartar.

Sábado foi dia de Cabo Ledo, de um mar mais azul que o céu, das conversas de esplanada com as lagostas do Queirós na mesa, da viagem de ida e de regresso e da noite Naquele Lugar já em Luanda. Magnífico.

No domingo descobrimos outro paraíso, em Sangano. Antes de Cabo Ledo, uma praia que pensámos quase deserta e que se tornou numa agradável e cheia surpresa ao chegar. Cheia de tudo! Tornou-se também numa angústia e tristeza ao partir. Só saímos de noite, mas realmente não queria mesmo sair de lá nesse dia. E nunca antes disso. Queria ficar e que o tempo parasse. Queria ver o pôr do sol que é algo extraordinário por aqui... Apaixona-nos. É um jogo de cores difusas lutando entre si para ganhar o imenso céu. É o sol que se transforma em tons de laranja e visível aos nossos olhos de contemplação, e depois em vermelho vivo e num fogo que ilumina em reflexo toda a baía. O mar e os rochedos. Um céu que rouba a cor ao mar e se une, num horizonte que não se distingue entre eles, desaparecendo entre a neblina. Céu e mar indistintos. E no fim do espectáculo o sol se retira, satisfeito, em magnífica apoteose. Tudo é quase mágico... intenso.

Segunda-feira decidi descansar destes dias de praia... E então fui para a praia também. Mas desta vez nem saí de Luanda... Não era preciso. O trânsito prometia ser interminável ao final do dia, para se entrar na cidade, vindo do sul, e por isso escolhi na ilha uma praia local, e dos locais, para passar mais um dia igualmente diferente. E com muita gente! Mas bom.
A praia cansa, é verdade... Após três dias desta vida difícil estou exausto. E quase preto... por fora e um pouco por dentro também. Ok, é cansativo... mas até gosto disto.

14.9.07

Porque Hoje...

... É sexta-feira!
Ando a dar em doido com o trabalho e estou farto de dizer asneiras hoje. 'Daquelas' que nos saem da boca sem querer. E também por querer, confesso... Até apetece e sabe bem.
Porque hoje começa um fim de semana de três dias e três noites, pois é feriado segunda-feira.
Porque hoje termina uma semana com poucas horas de sono mal aproveitadas.
Porque hoje acabei por ver uma ratazana no primeiro andar da empresa, praí com uns dois metros... Hum... 1 metro... Ok, era pequenina. Mas assustei-me e disse mais uma asneira.
Porque hoje tinha tudo preparado para ir até Benguela e já não vou porque toda a gente se lembrou do mesmo e já não há hotéis vagos.
Enfim... porque hoje aqui é tudo, vou só ali beber uns gin tónicos para parar de dizer asneiras.
Volto cedo, com o ar da manhã.

12.9.07

Os Petiscos

Às vinte horas ligo para marcar mesa.
- Alô Bruno! (reparem que já digo "alô"...) Que há de petiscos hoje?
- Tem picapau, chouriço assado, morçela, salsicha, picanha, moelas...
A lista não acabava. Mas acabei eu, estranhando... - Moelas?
- Iá, moelas.
Não queria acreditar - Moelas? Como moelas?
- Estufadas.
- ... Hum... E queijo? Há queijo?
- Tem sim, Castelões.
- Bruno, mesa para seis ás nove. Prepara aí as moelas, o picapau, as moelas, o chouriço, as moelas, o queijo, o ...
- Tá bom, deixa comigo.
- Ah! E vinho! Põe vinho no ...
- Deixa comigo, iá.
E assim foi. Às nove da noite lá estávamos na esplanada da Tendinha, nos petiscos lusos. E no vinho. Tudo maravilhoso, como quase sempre. E eu que nem sabia que se encontrariam moelas por cá! E estavam divinais, a sério.
E tem sido assim, pelo menos, uma vez por semana.
Bem, mas isso foi ontem... Hoje foi diferente. Como verdade ou consequência, hoje passei o dia 'na casinha'.

10.9.07

O Casamento

Só hoje ganhei a coragem de escrever sobre este dia. A verdade é que no passado domingo não estive por cá. Ausentei-me. Deixei tudo e fui para onde não fui. Estive sempre presente onde não estive, onde não pude estar. Mas consegui e fiz que estive, com alma e coração. O meu corpo não. Mas foi como se estivesse também, olhando através de um enorme vidro, inquebrável pela imaginação.

Hoje vi as fotos e imaginei-me lá. Não me contive. Encontrei nelas um espaço quase visível entre os meus amigos, um espaço que eles mesmo guardaram para mim, para eu poder sentir-me lá. Com eles. Imaginei os risos e sorrisos, os abraços sentidos, a felicidade incontida vivida nesse dia que, como muitos outros dias convosco, não tem dia igual.

E são estes os dias mais importantes de uma vida inteira. São estes os dias recordados para sempre e que à distância se dá um valor ainda mais incalculável. Mesmo. Aqui vejo e percebo que são esses os momentos que mais sentido dão a toda a nossa existência. São os amigos e os momentos com eles vividos. É o partilhar com eles a alegria de um dia que é para um, e para todos, como família, um passo de um rumo para uma vida inteira de felicidade. E será, tenho a certeza. Irei recordar este dia para sempre pela tristeza de não ver a vossa alegria, e como um dia da minha vida que não estive presente. Um dia mais que não vivi, infelizmente.
Faço minhas as minhas palavras, únicas coisas minhas escritas e entregues nesse dia e nesse momento, para o meu melhor amigo. E para todos vocês:

'Incrivelmente longe é a distância que hoje me separa de vós. Penso e sorrio ao ver que os anos passam e nada muda. A amizade é tão grande e antiga que já se tornou rocha, e cada vez mais rocha, e indestrutível mesmo com esta nossa distância e com o passar do tempo.'

A falta que me fazem é bem maior que o tempo que resta para vos ver de novo. Aguardo ansioso.

8.9.07

Bom Dia Camaradas

“Às vezes numa pequena coisa pode-se encontrar todas as coisas grandes da vida. Não é preciso explicar muito, basta olhar...”

Esta é uma pequena frase num pequeno livro que escolhi ler. ‘Bom dia Camaradas’, de Ondjaki, é todo ele saudade de outros tempos desta Luanda. Tempos outros em que a guerra consumia a esperança do povo e a felicidade se encontrava nas pequenas coisas da vida. Memórias de escola e de rua de uma criança de sorte. Recordações do povo cubano que ainda vive por cá, presente na lembrança. Riqueza das coisas pobres.
Ao ler este livro, tenho já a sensação de o conseguir entender. Conheço quase o passado. E conheço-o observando a cidade de hoje, as ruas de hoje, as pessoas de hoje, o povo de sempre. Observo todos os dias o presente e entendo assim o passado, quase presente. Basta olhar.
E ao ler este livro, quase que se sente. Luanda.

5.9.07

A Chuva

Sete da madrugada.
Acordei do sono com a chuva a bater levemente na janela do meu quarto. Num instante sem despertar mantive os olhos bem fechados e apenas imaginei. Olhos bem fechados. Prolonguei em mim por momentos a reconfortante sensação de estar no conforto do meu quarto da minha própria casa numa manhã de um saudoso domingo de chuva. Olhos bem fechados. Imaginei que não existe pressa para levantar e senti que me poderia deixar assim ficar e ir ficando neste calmo e lento despertar dos sentidos. Olhos bem fechados. Adormeci de novo, embalado por este sabor a casa que é desejo repetido destes sonhos quase despertos no meu acordar de todos os dias.
Ah... Como é bom estar em casa!
Abre-se a porta.
- Bom dia, sim? Desculpe, sim?
Fecha-se a porta.
Confuso e desperto olho para o relógio e cedo volto à realidade. Estou em Luanda. No hotel. Olhos bem abertos. Levanto-me com uma pressa inadiável em acordar para outro dia. Olhos bem abertos. Estou atrasado!
Paro então de imaginar e também lá fora a chuva parou. Aproximo-me da embaciada janela e observo as últimas gotas que caem do céu. Choveu mesmo, mas tudo o resto foi um sonho apenas.
Ah... Bendita chuva, que hoje me levaste a casa e te demoraste a trazer de volta a Luanda. Acorda-me sempre assim! Mas olha... Se quiseres, não me tragas de volta.

1.9.07

Ânimo

Acordar pela manhã com o cheiro da terra molhada e da maré baixa na baía.
Almoçar no Bordão e junto à praia um óptimo choco fresco grelhado.
Ir ao supermercado só pela cusquice de saber como é.
Dormir o resto da tarde.
Um dia em cheio até ser noite.
Jantar no Tamariz com um bom vinho a acompanhar.
Matar saudades do Chill Out. Gin tónico. Vários.
Éden. Ver o dia nascer.
Uma noite em cheio até ser dia.
Já estava a precisar.

29.8.07

O Aniversário

Hoje fiz anos. Foi um dia normal, como os outros... Normal. Em jeito de graça sem graça posso contudo dizer que almocei e jantei fora, mas isso faço-o todos os dias. Normal. Mas a verdade é que penso hoje que nunca pensei há uns meses atrás que iria passar o dia dos meus anos, por muito que eu não ligue a esta data (e não ligo), tão longe de casa e dos amigos. Mas custou-me, mais que os outros dias de outros anos.
O telemóvel toca todo o dia trazendo a lembrança da enorme distância e semeando em mim as saudades. É bom ouvir a família e os amigos que nos ligam. É óptimo! Mas ao mesmo tempo aperta-me o coração em cada desligar, como se a tecla vermelha no telemóvel fosse mesmo a tecla de On-Off que nos liga ao nosso querido mundo. On e Off. Presente e Distante.
Foi no final do jantar no Embaixador que a luz se apagou em todo o restaurante e, antes ainda de eu começar a praguejar por mais uma quebra de energia em Luanda, eis que surge o brilho ténue de duas velas ao fundo, que se aproximam deslumbrantes do brilho dos meus olhos e sobre um enorme bolo de aniversário. Surpresa! E de chocolate.
Adorei, meus amigos. Deu para entender que, apesar da tristeza de estar tão longe neste dia, temos sempre a amizade e a felicidade que se cria aqui, bem perto de nós e do nosso coração.
Parabéns a você. A mim.

27.8.07

De Novo

Preparei novamente a partida e esqueci-me de novo de coisas que nem sei ainda.
Realmente acho que nunca vou fazer uma viagem sem deixar algo para trás.
Mas estou de regresso, e sento-me agora resignado e pensativo no meu quarto do Hotel Trópico.
Penso que desta vez custou-me mais ainda a despedida. Foi bem mais difícil voltar… Não só pelo que deixo que me custa, mas também pelo que me espera aqui que nada tem de novo. E o tempo aí passou tão injustamente depressa!

Luanda está igual. Nada mudou. Apenas se sente ainda no hotel e nas ruas o ar de ressaca das comemorações de sábado passado: Angola sagrou-se campeã africana de Basquetebol. E pela nona vez. Até podia ser campeã de um campeonato regional de xadrez… O que é bem certo é que aqui se festeja por tudo e por nada. E para o povo angolano ganhar o Afrobasket foi tudo. E uma grande bebedeira em massa.
O tempo por aqui recebeu-me tal como eu me sinto: meio estranho. Um dia que nem chega a ser dia pois o sol não se digna a aparecer nesta cidade. Um dia quase noite todo o dia. E dizem-me que já choveu… Ora pois, está bem na altura! E o calor e humidade chega também aos poucos, para ficar. Chego ao aeroporto 4 de Fevereiro ás seis da manhã e estão já mais de 20º cá fora. E mosquitos. Que óptima recepção!
Se tinha saudades? Hum... - Não. Mas esta simpatia madrugadora das pessoas põe-me logo bem disposto pela manhã. Também isso não muda e felizmente sinto que só melhora com o tempo.

Vou sim é mudar um pouco este meu diário. Mudei agora as cores escuras para outras mais alegres - Ok, não mudou muito, pois não? - E chego à já esperada conclusão de que não consigo retomar o ritmo de posts diários, pois nem o pouco tempo nem a pouca internet me deixam. Mas prometo dar notícias sempre que possa ou que tenha algo de novo para contar, para que também eu possa contar e riscar assim os dias que passam. Lentamente.
Já risquei o dia 1.

7.8.07

Dia 58 - Finalmente

São dez da manhã e já aguardo impaciente no bar do hotel por alguém estranho que me irá levar ao aeroporto, onde também já tenho alguém que não eu a fazer em meu nome o demorado check-in . Por isso já tudo entreguei: o passaporte e o bilhete, as malas e até a própria alma.
Duas horas e gin tónicos depois chega o meu transporte e com um rápido 'até breve' me despeço do hotel que foi por todos estes dias a minha casa e que continuará a sê-lo quando eu voltar. Chego ao aeroporto através do trânsito infernal das horas de almoço e o Sr. Prazeres me recebe à entrada com o meu cartão de embarque, o meu passaporte e o seu sorriso de quem sabe sorrir. Para aquele momento não podia haver melhor apelido.
Aguardo impaciente e incrédulo na sala de embarque, depois de ter sido encaminhado (como a quase toda a gente) até uma pequena sala com uma secretária vazia onde por detrás dela um homem igualmente pequeno nos pergunta:
- Dólares ou Kwanzas?
Deu-me vontade de responder: - Hum... prefiro Dólares. Tem aí pra mim?
Mas a verdade é que a pergunta era outra, tal como a finalidade. Se eu levasse algum dinheiro comigo teria de ficar com ele (e para ele). Francamente... Respondi que não, enquanto sentia com os meus dedos no bolso traseiro das calças os dólares e kwanzas que trazia comigo. Muitos! E trouxe.
O voo parte com atraso, pois na hora prevista de partida ainda eu desesperava na sala de embarque. Mas partiu e para mim foi das melhores viagens que tenho feito. Talvez mesmo a melhor, pela simpatia e qualidade do serviço, pela calma e sossego no interior e lá fora e, claro, pelo destino. É sempre bom voltar a ver através da janela a ponte Vasco da Gama e sentir novamente os meus pés assentes no meu chão. É bem bom ver os meus que me esperam e matar assim as saudades que desesperam. É a felicidade plena de quem regressa e se alegra, mesmo sabendo que o bilhete tem ida e tem volta.
Olá a todos! Regresso dia 26.
Até breve.

6.8.07

Dia 57 - O Hábito

Estranho hábito este de me levantar e ir trabalhar mesmo quando não tenho de o fazer. Mas assim foi. Dei volta aos papéis em volta e tentei-os arrumar sem esconder, para que não me falte nem sobre nada quando eu regressar. Em dia de despedida preparo assim o meu regresso, já daqui a três semanas.
Com uma reunião apenas se justificou este meu dia e todo o anunciado adiar da minha partida. Hoje tinha que cá estar, e por um lado ainda bem que assim foi. Um lado sombrio, é certo, mas ainda bem.
Sinto um estranho nervosismo enquanto vejo as horas passar, que atribuo à ansiedade pelo chegar da hora da partida. É curioso: sinto-me feliz por partir amanhã, mas também me sinto feliz por saber que volto. E penso que é bom sinal.
Despeço-me dos lugares das pessoas e das coisas com um até breve sincero e suspiro com nostalgia antes de fechar docemente a porta da minha sala. Por agora, já está.

5.8.07

Dia 56 - O Pequeno Almoço

Acordo bem disposto antes das dez da madrugada e bem a tempo do pequeno almoço no hotel. Desço até ao amplo salão e sinto que toda a mesma gente pensou no mesmo à mesma hora neste mesmo domingo de tranquilidade. Mas tranquilo continuei, conseguindo escolher com dificuldade uma mesa para me sentar. Só eu.
Confesso que não sou muito de pequenos almoços, e ao acordar a comida fica sempre para bem depois ou nunca depois, mas hoje apeteceu-me. Mais que a fome que não tinha sentia-me com vontade de aproveitar as horas da melhor forma como sendo as últimas, e como se precisasse de informar o próprio dia que estou quase de partida, com claros e serenos gestos de despedida.
Preparo um croissant misto e acompanho-o com sumo de laranja. Depois o bacon e os ovos mal mexidos. Depois ainda a fruta fresca e termino em grande com o café expresso. Como vêm, é um típico pequeno almoço africano...
O dia mostra-se cinzento através da parede de vidro que separa a sala de refeições do verde azul do relvado e da piscina lá fora. Reparo que nas mesas à minha volta vive-se também a calma de um domingo de paz, até mesmo nos rostos cansados daqueles lá ao canto que, bem sei, hoje mesmo chegaram no primeiro avião que veio de Lisboa. Há cinquenta e seis dias era assim, como o deles, o meu rosto. Hoje felizmente sorrio nostálgico ao recordar a minha chegada.
Prolongo-me em pensamentos distantes ao som das vozes em meu redor, e deixo-me ficar ouvindo um pouco mais, acompanhando assim sem convite as conversas dos outros. Notícias frescas da terra. Mas tenho todo o tempo que dura um dia para passar este domingo da melhor e mais rápida forma que conseguir inventar. E não foi preciso pensar muito... Felizmente tenho os meus muitos livros que trouxe e que felizmente não li e nem terminei um só, por falta de tempo. É hoje afinal.
Faltam 2 dias.

4.8.07

Dia 55 - De Veneza a Miami

Porque hoje é sábado. Depois de um passeio descalço pela praia num paraíso com pouco sol e água fria acabo por ir jantar a Veneza. Veneza é o nome do talvez mais português e tradicional restaurante de Luanda. A uns quarteirões apenas da igreja da Sagrada Família, na zona do Maculusso, foi a informação que bastou para o encontrar. Isso e uma hora inteirinha às voltas por ali, entre ruas que parecem sempre iguais e com sentidos sempre diferentes. Mas chegámos lá mesmo à hora certa da fome.
Foi bom para matar as saudades e sentirmo-nos em casa. Melhor escrevendo, em Portugal. Além da boa comida da nossa terra em doses xl de um bom bacalhau ou cozido à portuguesa, ou mesmo uma alheira de Mirandela, todo o espaço é puramente 'nosso'. E está-se lusitanamente na boa. Contudo, estranhamente comi picanha à brasileira. Também me agradei ao ver os dois grandes plasmas em cada lado da enorme sala, sempre a transmitir os jogos do nosso campeonato - como não é hoje o caso - e por isso cá voltarei concerteza para ver 'em casa' os jogos do meu SLB acompanhados com um bom jantar e óptima companhia.

Depois de demoradas feitas e pagas as contas de Veneza fomos até Miami. E o Miami é mais um daqueles óptimos sítios da ilha (sou suspeito: o Chill Out está fechado). Com muita gente gira, um espectáculo de bailarinos e ritmo latino e africano e, claro está, muitos portugueses, o Miami é o Verão ao ar livre destas noites de Inverno. Bem quente.

Hoje foi o dia menos um da minha contagem decrescente e da saudade crescente. Depois de uma semana de tempestade interior, hoje acabei por passar um sábado radioso com planos e destinos felizes previstos à pressa neste dia imprevisto. E tudo acabou bem e a sorrir. Foi assim um dia que felizmente inventei.

3.8.07

Dia 54 - A Despedida

Hoje foi dia de dizer adeus. De inventar pela manhã um inesperado adeus a quem parte e não a quem fica como assim antes eu esperava que fosse.
Esta vivência em Luanda cria laços de grande amizade entre quem passa tantos e tão bons (e menos bons) momentos juntos. Tudo é mais intenso no viver e no sentir e bem mais difícil na despedida. Por isso hoje sou o outro lado que não quero ser e sinto-me mesmo do avesso. Ao contrário e triste.
Mas estou feliz pela alegria de quem parte e mostro-o com um sincero e mudo sorriso. Sobretudo porque também sei que hoje não é um adeus mas sim um até breve. Onde quer que seja.

Sabem... sinto-me mesmo perdido sem vocês.
Um abraço, J. e L.

2.8.07

Dia 53 - Naquele Lugar

Na velha e despida calçada que sobe até à fortaleza encontrei o restaurante mais agradável de Luanda. Naquele Lugar. Nele entra-se a medo, com a estranha sensação de estarmos a invadir qualquer casa alheia. De facto, vista de fora esta é uma casa antiga e igual a tantas outras. Portuguesa. Cá fora nem letreiro nem um só nome nem ninguém a indicar, apenas uma luz ténue nos espreita e nos convida por entre a porta entreaberta. Subimos o pial e entramos, como quem julga conhecer já o desconhecido.
Uma primeira e pequena sala nos recebe, com pinturas a óleo e estatuetas decorando as paredes rústicas e apagadas pelo tempo. Só a sala decorada nos recebe a sós e por momentos temos a certeza de que estamos enganados. Mas ao fundo da sala e em frente à porta por onde entrámos outra porta nos chama de curiosidade e através dela vemos mais luz, ouvem-se algumas vozes ao fundo, e espreitam umas escadas de pedra que nos convidam a descer.
Uma descida até ao deslumbramento. Um pátio com chão de pedra fresca e rodeado por um branco de cal das paredes gastas e altas e descobertas num brilhante céu de estrelas. Vários pátios aliás, ligados e escondidos uns dos outros por entre abertas portas e postigos. As simples mesas e cadeiras de esplanada espalhadas e ordenadas no espaço separam o poço de desejos ao fundo de uma árvore pelo meio e do verde vivo de outras plantas em vasos que vestem tudo o resto que não descrevo.
Já tinha marcado previamente este jantar, há um tempo atrás, julgando outrora que esta seria a minha última noite em Luanda antes de voltar de férias a Portugal. Já conhecia também este sítio magnífico e a amabilidade do gerente (o Nanni) que sabe muito bem como se faz uma casa - sem letreiros à porta. Já conhecia a divindade da comida também... Faltava ainda conhecer algo mais. E por isso num pequeno alpendre que dá para o mesmo pátio ouvem-se os primeiros acordes de uma noite que é também noite de música ao vivo. Foi também por isso que vim, e confesso que foi a melhor banda que já ouvi por estas bandas. E das melhores vozes do mundo.
Mas a noite fugia teimosa e apressada pelo tempo que desejei outra vez que parasse por um tempo. Queria só estar e sentir a música dos meus tempos e de outros tempos me embalar na boa companhia das pessoas à minha volta e da magia e calma deste lugar que encontrei único. Queria também guardar comigo a presença e réstia de companhia de quem estimo e de quem amanhã vai embora e que, para eles sim, esta é a última noite antes da partida.
Foi, por isto tudo, uma noite memorável. Naquele Lugar magnífico.

1.8.07

Dia 52 - O Dia Mau

Acordo com uma terrível dor de dentes, daquelas insuportáveis que nos faz apetecer dar murros a nós mesmos. E eu quase que dei.

Tive ainda assim uma suportável apresentação toda a manhã e o trabalho que aperta nesta fase final antes de partir para férias. A dor de dentes terá de ficar para depois, pensei. Mas não - chegou pra ficar.

Mas hoje soube que afinal já não faltam só dois dias para o meu regresso a Portugal, mas ainda mais uns seis. Nem sei bem... Até podiam ser mais mil que para mim já não importava. Mantinha apenas no pensamento um amargo adiar de ansiedade e das saudades e esta triste realidade que se apoderou de mim até ao fim destes dias: eis-me sozinho, de malas feitas e coração desfeito.

Mas já que falo em coração hoje também fiquei preso no elevador. Foram duas horas de terror! Quer dizer... disseram-me depois que foram dois minutos apenas. Mas eu juro que me pareceram duas horas. Ou mais! E algum dia tinha de ser, certo? E porque não hoje? Foi uma boa escolha dos deuses, juntar tudo num só dia.

Este dia está a ser o máximo - penso. Que mais me irá acontecer? Já estava por tudo e triste como a noite que não mais chegava. Ao menos que tudo me acontecesse hoje! Saio então desprevenido pela rua procurando mais infortúnios. E respirar um pouco também.

Mas infelizmente nada mais me aconteceu e tudo passou pouco depois. Passou a tristeza por ficar mais uns dias e passou a lembrança das horas tristes deste dia. Sorrio no seu fim, com um contentamento descontente, ao ver que este dia acabou. Sinto-me melhor e penso que já tudo passou. Tudo, menos a dor de dentes.
E faltam 6 dias.

31.7.07

Dia 51 - A Internet

Ainda é um mito por aqui. Até há, mas não há. A verdade é que é esta a infeliz conclusão a que chego aqui, e a não menos infeliz e contundente resposta que obtenho no hotel. Desco do meu quarto até à recepção tentando encontrar respostas para não ter internet no quarto há já alguns dias. É que prefiro ter, mesmo quase não tendo, do que não ter. Ao menos vejo o mundo a girar no canto do meu monitor e mantenho assim uma calorosa esperança e ansiedade de entrar em alguma página. Neste meu blog, por exemplo.
Na recepção dizem-me que realmente não tenho internet no quarto - Que génios, hã?
- Mas não há internet? - Pergunto eu.
- Ainda, senhor. Só ali no bar.
- Pois, eu sei. Mas eu já tive internet no quarto, há uns dias atrás.
- Não pode senhor. Não há internet nos quartos.
- Mas eu mesmo agora confirmei e os meus colegas no 5º andar têm internet no quarto deles.
- Não pode senhor. Não têm.
- Têm sim, juro! Vim agora de lá!
- Não pode senhor...
- Mas pode por favor confirmar ou esclarecer com mais alguém?
Entra por uma porta e sai dois segundos depois:
- Não têm não, senhor. Não há internet nos quartos. Só no bar.
Suspiro.
Queria com isto justificar um pouco o muito atraso neste meu diário. Juro que tenho tudo apontado e bem vincado em papel ou em pensamento. Prometo assim não deixar nada para trás e nem me esquecer de nada, destes meus dias, nos meus dias em Portugal.

30.7.07

Dia 50 - O Acontecimento

É o acontecimento do ano em Angola e por isso todo o país se prepara para receber o AfroBasket 2007. É o 24º campeonato africano de basquetebol masculino, que tem Angola como anfitriã e também como actual detentora do título. No basket eles são grandes! E literalmente também.

O campeonato irá decorrer entre os dias 15 e 25 de Agosto em quatro cidades de Angola. Benguela, Lubango, Huambo e Cabinda vestem os seus trajes de gala e mostram Angola ao mundo. No entanto, é o estádio da cidadela em Luanda que servirá de palco e receberá a cerimónia de abertura e o jogo inaugural do campeonato: Angola vs. Ruanda.

Aqui pelo hotel andam os Harlem Globetrotters... Devem cá estar para a cerimónia de abertura, ou para uma outra demonstração qualquer. Eu é que já dei um jeito qualquer ao pescoço só de olhar para eles. De muito baixo para muito cima. Enormes!
Mas vejam estas imagens de Luanda. Convencia qualquer turista, não acham?

29.7.07

Dia 49 - Um Resumo

Acordo indisposto para mais um domingo e penso feliz que este domingo será o último dos primeiros domingos.
Recordo-me ainda da noite anterior. Do jantar magnífico naquele lugar junto à Fortaleza. Recordo a última e agitada noite do Chill Out, que foi também a sua última noite antes das férias. E recordo-me que, de tudo o resto, mais nada me consigo recordar. Mas fica a vincada lembrança de que este último sábado foi mesmo um grande dia. E uma grande noite.
E neste domingo vou até à ilha do Mussulo. Tinha de lá ir. E ao chegar ao embarcadouro dezenas de miúdos correm e se atropelam atrás do carro e disputam entre si para ver quem fica a guardar o nosso carro e quem e em qual barco é que nos leva até a ilha. Lá fomos com o Zézito, até ao sítio na ilha que ele próprio e bem nos recomendou. A Roça das Mangueiras. Recomendo eu também uma visita. É um fascínio.
Neste domingo faço também eu um balanço destes 49 dias e 48 noites. Um resumo do mesmo. Luanda tem o bom e o mau, como em qualquer outra parte do mundo, mas ambos elevados a um extremo tendencial. Caminham até um extremo oposto, andando no entanto lado a lado. E isto porque não há bom sem haver mau, como não existe o bem se não existir o mal. E estas duas realidades encontram-se facilmente nestas ruas... Em todos os recantos destas ruas a pobreza e a riqueza andam de mãos dadas, precisando uma da outra. Ajudam-se a crescer mutuamente e a afastar-se ainda mais na distância e num contraste mais que imperfeito, mas que parece resultar em perfeição aos olhos do povo... que não vê.
Compreendo agora que tenho vivido o bom e evitado o mau. Passa-me ao lado. Em quase dois meses de vivência em Luanda assim declaro a minha ignorância sobre como se vive em Luanda. Não posso sabê-lo. Talvez saiba apenas como se vive bem em Luanda, e aí faço de mim um exemplo de conhecimento. Mas tudo o resto que é quase tudo nada sei ainda. Só sei o pouco que vejo e penso que embora queira saber mais temo, pois para o saber teria que vivê-lo, e eu prefiro vê-lo. Apenas vê-lo na distância.
Mas agora não... depois. Agora quero mesmo é ir para casa e conto já as horas dos poucos dias que faltam. Está quase.

28.7.07

Dia 48 - O Turista

Pegamos no carro e vamos descobrir juntos os sítios que até agora andavam infelizmente escondidos da minha vivência na cidade. Hoje fui realmente um turista em Luanda.
Comecei junto à baía, no Clube Naval de Luanda, admirando a vista incrível sobre a cidade e sobre os barcos incríveis também. Ainda pensámos alugar um barco, mas achámos que 1.500 Euros por dia seria um bocadinho caro. Um bocadinho...

- Sim, é Luanda!

Seguiu-se um almoço prolongado no Bordão, um restaurante mesmo no final da 'ilha' de Luanda e junto à praia, que me fez sentir quase como em casa, pela boa comida, pela decoração que nada tem de Luanda e que tudo tem de Portugal. Até o leitão à bairrada é a especialidade da casa. Bom sítio para se aproveitar a praia e passar um dia sossegado de sol na ilha.

Após um pequeno passeio pela praia, até a um dos muitos pontões em cubos de cimento feito e que mal protege a areia do seu mar, voltamos ao outro lado da cidade e até à vista que daqui se via.

A Fortaleza de S. Miguel. Já com 400 anos de história, é concerteza um dos principais patrimónios históricos da cidade de Luanda e do país inteiro. Encontra-se degradada por dentro e por fora, embora por vezes se organizem eventos entre as suas muralhas. Cá fora à entrada, além de alguns chaimites e aviões e outras peças de artilharia ou despojos de guerra completamente destruídos (nem sei se o foram ali pelo povo ou se muito antes pela guerra) consegue-se talvez a melhor vista sobre a cidade. Caminhando em volta da fortaleza observamos Luanda em todo o seu esplendor: o bom e o mau que aqui de cima tem, aos nossos olhos, a mesma beleza.


Cine Miramar. Num dos melhores bairros de Luanda um antigo cinema conserva ainda vivas as cadeiras e as memórias de grandes tempos, que o eram concerteza. Tem igualmente uma vista incrível sobre a baixa da cidade, e por momentos imaginei como seria magnifico estar aqui há muitos anos atrás, em noites de cinema e de luar. Juro que nem saberia ao certo escolher entre a ficção da tela e realidade dessas noites passadas e desta vista tão bela sobre a cidade que outrora era igualmente tão bela.

Conheci hoje uma Luanda diferente. Restos de uma Luanda que parou no tempo e que nos mostra ainda um pouco do que tanto os nossos pais falam dela. Mas é apenas um pouco, que ainda se mantém por mero acaso e desprezo, nesta cidade e neste país que aos poucos vai perdendo e esquecendo (porque assim o deseja) a nossa cultura, os nossos valores e tradições, o nosso património e a nossa (e sua) própria história. A Luanda vai-lhe faltando a sua origem e identidade.

27.7.07

Dia 47 - O Fado

Sexta feira é um bom dia. Um fim de semana que começa cedo, logo na sexta à noite. E hoje foi um dia de emoções para mim, pois conduzi pela primeira vez em Luanda. E pela primeira vez também conduzi um carro com mudanças automáticas. Emoção dois em um. Custa só os primeiros minutos... até comprovar que se puser um pé no acelerador e outro no travão o carro não anda mesmo. E conduzir em Luanda afinal é fácil! Basta sermos igualmente loucos.
Começou em grande, pois logo ao sair da garagem do hotel fui mandado encostar pelo xôr agente da autoridade e seu apito de brincar que me obrigou a pagar uma gasosa, por 'não' ter respeitado um sinal que 'não' havia. Literalmente disse-me:
- Eu só queria um suminho...
Enfim, foi bem mais arrojado do que pedir gasosa... E pela imaginação, inovação e graça, dei-lhe 1000 Kz.

Desta vez fomos descobrir com surpresa um restaurante bem engraçado, junto ao estádio dos Coqueiros aqui na baixa da cidade. O Tia Maria, no Clube de Ténis de Luanda. Um leão enorme à porta não deixa margem para errar - era mesmo aquele o sítio. É ao ar livre, sobre um jango enorme, bem decorado a velas e mosquitos e bem junto aos vários campos de ténis vazios mas iluminados. Uma mesa já nos esperava, para compensar o tempo que haveríamos de esperar depois para que viesse finalmente o que pedimos - uma moqueca de marisco. Espectáculo!
Mas a surpresa mais que surpresa veio logo depois. Um grupo de fadistas se levanta e começa a encher a nossa noite de música de saudade e nostalgia. Lembrei-me ao som das guitarras que hoje mesmo estaria concerteza na minha terra em plenas festas da aldeia. Lembrei-me de quem canta comigo e das saudades que tenho de os ouvir cantar. Recordei tudo aquilo que o nosso fado nos traz e que nos aquece o coração, e com isso fiquei um pouco triste, é verdade, mas ao mesmo tempo senti-me bem mais perto dos meus, mesmo estando aqui tão longe.
Bem finda a fase da nostalgia e já com algum aperto no coração, saio do fado e regresso ao meu Chill Out (já vos disse que é mesmo muito bom?). Acompanho a lua sozinha e cheia no mar e na areia da praia, e ela me faz igual companhia, ao som de um som que não é fado mas que tem sido o meu fado por aqui.
Penso no que daria hoje para estar com vocês desse lado, e sorrio por pensar que mesmo a esta distância temos sempre a lua para compartilhar. A mesma lua que sempre nos acompanha no tempo e na distância, para provar que nem tudo muda com a ausência e o passar dos anos.
Pouco depois um telefonema encheu-me o coração e fez-me chorar. Já esperava que fosse assim... é sempre assim quando não estou.
A. - meu grande amigo, para ti um abraço forte!

26.7.07

Dia 46 - As Cidades e os Nomes

Tive curiosidade e procurei um pouco pela internet pelos antigos nomes das principais cidades de Angola. Então fiquei a saber, por exemplo, que Luanda se chamava antigamente de São Paulo da Assunção de Luanda. Confesso que agora está bem melhor. É Luanda para os amigos.
Entretanto reparei que, infelizmente, nem todas as cidades tiveram a mesma sorte... Por exemplo a antiga Vila Robert Williams que passou a chamar-se de Caála, ou a Vila João de Almeida que agora é Chíbia.
Segue então a lista de alguns nomes do antigamente, quando até os nomes eram nossos.

Amboim (Porto Amboim)
Bailundo (Vila Teixeira da Silva)
Benguela (São Filipe de Benguela)
Calandula (Duque de Bragança)
Camacupa (Vila General Machado)
Ganda (Vila Mariano Machado)
Huambo (Nova Lisboa)
Kuito (Silva Porto)
Kuvango (Vila da Ponte)
Lubango (Sá da Bandeira)
Lwena (Vila Luso)
Massango (Forte República)
M'Banza Kongo (São Salvador do Congo)
Menongue (Serpa Pinto)
Namibe (Moçâmedes)
N'Dalatando (Vila Salazar)
N'Giva (Vila Pereira d'Eça)
Saurimo (Vila Henrique de Carvalho)
Soyo (Santo António do Zaire)
Sumbe (Novo Redondo)
Tombua (Porto Alexandre)
Uíje (Carmona)

25.7.07

Dia 45 - Os Kwanzas


O Kwanza é, como sabem, a principal moeda de Angola. Ou melhor escrevendo: é a principal nota, pois não há moedas.
Como nota é uma moeda que ganhou nos últimos anos uma valorização incrível. Enquanto que no último passar de século um dólar equivalia a uns bons milhares de kwanzas e consequentes saídas à rua com um grande saco de notas (ao estilo pai natal), hoje um dólar ‘paga-se’ com 75 kwanzas apenas. Umas notitas.
Deixo-vos algo matemático e útil para quem vem de visita a Angola: 1 € = 100 Kz = 0,75 Usd. É fácil. Não é um câmbio fixo, mas é mais ou menos. Nas ruas e nas lojas e restaurantes praticam-se taxas diferentes consoante o sítio (entre 73 e 77 Kz por dólar), por isso é preciso também ter algum cuidado com o troco em Kwanzas... Por vezes compensa, por outras vezes não. Mas em 90% dos casos o câmbio é a 75 e não há contas difíceis a fazer. Além disso, convém sempre dar de vez em quando algum uso à calculadora que vem no telemóvel, certo?
Mas a verdade é que com dólares no bolso vamos a todo o lado e paga-se tudo, embora o troco seja sempre dado em kwanzas. Os angolanos não gostam de dólares mas aceitam-os olhando sempre para a nota quando lhes damos uma. Desconfiados conferem se o presidente americano em cada nota tem ou não uma cabeça grande… (um pouco como o actual: todos têm de ser cabeçudos). Isto porque reza a história que há uns tempos atrás circulavam por aqui imensas notas falsas de dólar, o que obrigou à emissão e circulação de novas e diferentes notas, estas com os presidentes bem maiores e mais cabeçudos que então. E desde então, como um ritual que se criou no povo angolano, as pessoas olham sempre para as notas a confirmar as cabeças. Mas não gostam mesmo do dólar, e um exemplo é as gasosas que se dão. As pessoas da rua preferem os kwanzas, que são mais coloridos. E preferem por exemplo 100 Kz do que se lhes dermos 2 dólares.
Quem é inteligente? Eles, claro.

24.7.07

Dia 44 - A Cidade


Sim, é Luanda. É este o meu mundo emprestado.
Desta janela vos empresto assim o meu olhar encantado.
Com todo o prazer.

23.7.07

Dia 43 – A Comida

E o que é que se come aqui?
Sobretudo come-se em português. Em bom português. É incrível, porque não sou eu que procuro e escolho, por serem portugueses, os sítios onde vou almoçar ou jantar, mas são sim os próprios sítios que escolhem a comida. E a comida é sempre portuguesa.
Ou quase sempre. Também há o funge, a muamba ou o mufete, como exemplos de pratos de eleição e de excepção à regra da comida portuguesa.

O funge tem um aspecto semelhante ao puré. Se formos positivos. A mim mais me parece, sinceramente, outra coisa... Uma cola pegajosa talvez. Uma papa consistente feita à base de farinha de milho ou de mandioca, conforme os gostos ou o mau gosto. O milho dá-lhe um aspecto amarelado, enquanto que a mandioca confere-lhe um aspecto acinzentado e castanho. Vá o diabo e escolha. O sabor nem sei bem... a mim não me sabe a nada. É insípido mesmo. Mas acompanha bem a moamba de galinha. Segundo dizem.

A moamba de galinha é muito boa. É o prato típico de Angola. Mas eu acompanho-a com arroz, para fugir do funge. Basicamente é galinha (espero) coberta com um molho excepcional, que me sabe a ginguba (que é amendoim).

O mufete é peixe. Peixe inteiro assado com todos. Ou melhor... assado com tudo. Escamas e tripas. Por cima e à volta é servido com uma mistura de pimentos e tomate. E jindungo. Mufete foi portanto coisa que não provei ainda. Evidente.
Jindungo é a malagueta daqui. Muito picante e muito diferente de sítio para sítio no tom e no sabor. Mas sempre muito picante. Aqui jindungo acompanha-se com tudo. Com pão com fruta e com todos os pratos. Só não acompanha comigo.

Resumindo, digo-vos que os pratos angolanos são muito bons e até recomendo. Mas eu cá sinceramente prefiro lagosta.

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