Difícil não é sentir a falta de quem nos faz falta.
É pensar no tempo que falta, no tempo que não volta e sufoca, e nas voltas da vida que o tempo nos dá. Fica a esperança de que o tempo aqui me sorria e me traga a vida de volta.
E tem sorrido...


28.7.07

Dia 48 - O Turista

Pegamos no carro e vamos descobrir juntos os sítios que até agora andavam infelizmente escondidos da minha vivência na cidade. Hoje fui realmente um turista em Luanda.
Comecei junto à baía, no Clube Naval de Luanda, admirando a vista incrível sobre a cidade e sobre os barcos incríveis também. Ainda pensámos alugar um barco, mas achámos que 1.500 Euros por dia seria um bocadinho caro. Um bocadinho...

- Sim, é Luanda!

Seguiu-se um almoço prolongado no Bordão, um restaurante mesmo no final da 'ilha' de Luanda e junto à praia, que me fez sentir quase como em casa, pela boa comida, pela decoração que nada tem de Luanda e que tudo tem de Portugal. Até o leitão à bairrada é a especialidade da casa. Bom sítio para se aproveitar a praia e passar um dia sossegado de sol na ilha.

Após um pequeno passeio pela praia, até a um dos muitos pontões em cubos de cimento feito e que mal protege a areia do seu mar, voltamos ao outro lado da cidade e até à vista que daqui se via.

A Fortaleza de S. Miguel. Já com 400 anos de história, é concerteza um dos principais patrimónios históricos da cidade de Luanda e do país inteiro. Encontra-se degradada por dentro e por fora, embora por vezes se organizem eventos entre as suas muralhas. Cá fora à entrada, além de alguns chaimites e aviões e outras peças de artilharia ou despojos de guerra completamente destruídos (nem sei se o foram ali pelo povo ou se muito antes pela guerra) consegue-se talvez a melhor vista sobre a cidade. Caminhando em volta da fortaleza observamos Luanda em todo o seu esplendor: o bom e o mau que aqui de cima tem, aos nossos olhos, a mesma beleza.


Cine Miramar. Num dos melhores bairros de Luanda um antigo cinema conserva ainda vivas as cadeiras e as memórias de grandes tempos, que o eram concerteza. Tem igualmente uma vista incrível sobre a baixa da cidade, e por momentos imaginei como seria magnifico estar aqui há muitos anos atrás, em noites de cinema e de luar. Juro que nem saberia ao certo escolher entre a ficção da tela e realidade dessas noites passadas e desta vista tão bela sobre a cidade que outrora era igualmente tão bela.

Conheci hoje uma Luanda diferente. Restos de uma Luanda que parou no tempo e que nos mostra ainda um pouco do que tanto os nossos pais falam dela. Mas é apenas um pouco, que ainda se mantém por mero acaso e desprezo, nesta cidade e neste país que aos poucos vai perdendo e esquecendo (porque assim o deseja) a nossa cultura, os nossos valores e tradições, o nosso património e a nossa (e sua) própria história. A Luanda vai-lhe faltando a sua origem e identidade.

27.7.07

Dia 47 - O Fado

Sexta feira é um bom dia. Um fim de semana que começa cedo, logo na sexta à noite. E hoje foi um dia de emoções para mim, pois conduzi pela primeira vez em Luanda. E pela primeira vez também conduzi um carro com mudanças automáticas. Emoção dois em um. Custa só os primeiros minutos... até comprovar que se puser um pé no acelerador e outro no travão o carro não anda mesmo. E conduzir em Luanda afinal é fácil! Basta sermos igualmente loucos.
Começou em grande, pois logo ao sair da garagem do hotel fui mandado encostar pelo xôr agente da autoridade e seu apito de brincar que me obrigou a pagar uma gasosa, por 'não' ter respeitado um sinal que 'não' havia. Literalmente disse-me:
- Eu só queria um suminho...
Enfim, foi bem mais arrojado do que pedir gasosa... E pela imaginação, inovação e graça, dei-lhe 1000 Kz.

Desta vez fomos descobrir com surpresa um restaurante bem engraçado, junto ao estádio dos Coqueiros aqui na baixa da cidade. O Tia Maria, no Clube de Ténis de Luanda. Um leão enorme à porta não deixa margem para errar - era mesmo aquele o sítio. É ao ar livre, sobre um jango enorme, bem decorado a velas e mosquitos e bem junto aos vários campos de ténis vazios mas iluminados. Uma mesa já nos esperava, para compensar o tempo que haveríamos de esperar depois para que viesse finalmente o que pedimos - uma moqueca de marisco. Espectáculo!
Mas a surpresa mais que surpresa veio logo depois. Um grupo de fadistas se levanta e começa a encher a nossa noite de música de saudade e nostalgia. Lembrei-me ao som das guitarras que hoje mesmo estaria concerteza na minha terra em plenas festas da aldeia. Lembrei-me de quem canta comigo e das saudades que tenho de os ouvir cantar. Recordei tudo aquilo que o nosso fado nos traz e que nos aquece o coração, e com isso fiquei um pouco triste, é verdade, mas ao mesmo tempo senti-me bem mais perto dos meus, mesmo estando aqui tão longe.
Bem finda a fase da nostalgia e já com algum aperto no coração, saio do fado e regresso ao meu Chill Out (já vos disse que é mesmo muito bom?). Acompanho a lua sozinha e cheia no mar e na areia da praia, e ela me faz igual companhia, ao som de um som que não é fado mas que tem sido o meu fado por aqui.
Penso no que daria hoje para estar com vocês desse lado, e sorrio por pensar que mesmo a esta distância temos sempre a lua para compartilhar. A mesma lua que sempre nos acompanha no tempo e na distância, para provar que nem tudo muda com a ausência e o passar dos anos.
Pouco depois um telefonema encheu-me o coração e fez-me chorar. Já esperava que fosse assim... é sempre assim quando não estou.
A. - meu grande amigo, para ti um abraço forte!

26.7.07

Dia 46 - As Cidades e os Nomes

Tive curiosidade e procurei um pouco pela internet pelos antigos nomes das principais cidades de Angola. Então fiquei a saber, por exemplo, que Luanda se chamava antigamente de São Paulo da Assunção de Luanda. Confesso que agora está bem melhor. É Luanda para os amigos.
Entretanto reparei que, infelizmente, nem todas as cidades tiveram a mesma sorte... Por exemplo a antiga Vila Robert Williams que passou a chamar-se de Caála, ou a Vila João de Almeida que agora é Chíbia.
Segue então a lista de alguns nomes do antigamente, quando até os nomes eram nossos.

Amboim (Porto Amboim)
Bailundo (Vila Teixeira da Silva)
Benguela (São Filipe de Benguela)
Calandula (Duque de Bragança)
Camacupa (Vila General Machado)
Ganda (Vila Mariano Machado)
Huambo (Nova Lisboa)
Kuito (Silva Porto)
Kuvango (Vila da Ponte)
Lubango (Sá da Bandeira)
Lwena (Vila Luso)
Massango (Forte República)
M'Banza Kongo (São Salvador do Congo)
Menongue (Serpa Pinto)
Namibe (Moçâmedes)
N'Dalatando (Vila Salazar)
N'Giva (Vila Pereira d'Eça)
Saurimo (Vila Henrique de Carvalho)
Soyo (Santo António do Zaire)
Sumbe (Novo Redondo)
Tombua (Porto Alexandre)
Uíje (Carmona)

25.7.07

Dia 45 - Os Kwanzas


O Kwanza é, como sabem, a principal moeda de Angola. Ou melhor escrevendo: é a principal nota, pois não há moedas.
Como nota é uma moeda que ganhou nos últimos anos uma valorização incrível. Enquanto que no último passar de século um dólar equivalia a uns bons milhares de kwanzas e consequentes saídas à rua com um grande saco de notas (ao estilo pai natal), hoje um dólar ‘paga-se’ com 75 kwanzas apenas. Umas notitas.
Deixo-vos algo matemático e útil para quem vem de visita a Angola: 1 € = 100 Kz = 0,75 Usd. É fácil. Não é um câmbio fixo, mas é mais ou menos. Nas ruas e nas lojas e restaurantes praticam-se taxas diferentes consoante o sítio (entre 73 e 77 Kz por dólar), por isso é preciso também ter algum cuidado com o troco em Kwanzas... Por vezes compensa, por outras vezes não. Mas em 90% dos casos o câmbio é a 75 e não há contas difíceis a fazer. Além disso, convém sempre dar de vez em quando algum uso à calculadora que vem no telemóvel, certo?
Mas a verdade é que com dólares no bolso vamos a todo o lado e paga-se tudo, embora o troco seja sempre dado em kwanzas. Os angolanos não gostam de dólares mas aceitam-os olhando sempre para a nota quando lhes damos uma. Desconfiados conferem se o presidente americano em cada nota tem ou não uma cabeça grande… (um pouco como o actual: todos têm de ser cabeçudos). Isto porque reza a história que há uns tempos atrás circulavam por aqui imensas notas falsas de dólar, o que obrigou à emissão e circulação de novas e diferentes notas, estas com os presidentes bem maiores e mais cabeçudos que então. E desde então, como um ritual que se criou no povo angolano, as pessoas olham sempre para as notas a confirmar as cabeças. Mas não gostam mesmo do dólar, e um exemplo é as gasosas que se dão. As pessoas da rua preferem os kwanzas, que são mais coloridos. E preferem por exemplo 100 Kz do que se lhes dermos 2 dólares.
Quem é inteligente? Eles, claro.

24.7.07

Dia 44 - A Cidade


Sim, é Luanda. É este o meu mundo emprestado.
Desta janela vos empresto assim o meu olhar encantado.
Com todo o prazer.

23.7.07

Dia 43 – A Comida

E o que é que se come aqui?
Sobretudo come-se em português. Em bom português. É incrível, porque não sou eu que procuro e escolho, por serem portugueses, os sítios onde vou almoçar ou jantar, mas são sim os próprios sítios que escolhem a comida. E a comida é sempre portuguesa.
Ou quase sempre. Também há o funge, a muamba ou o mufete, como exemplos de pratos de eleição e de excepção à regra da comida portuguesa.

O funge tem um aspecto semelhante ao puré. Se formos positivos. A mim mais me parece, sinceramente, outra coisa... Uma cola pegajosa talvez. Uma papa consistente feita à base de farinha de milho ou de mandioca, conforme os gostos ou o mau gosto. O milho dá-lhe um aspecto amarelado, enquanto que a mandioca confere-lhe um aspecto acinzentado e castanho. Vá o diabo e escolha. O sabor nem sei bem... a mim não me sabe a nada. É insípido mesmo. Mas acompanha bem a moamba de galinha. Segundo dizem.

A moamba de galinha é muito boa. É o prato típico de Angola. Mas eu acompanho-a com arroz, para fugir do funge. Basicamente é galinha (espero) coberta com um molho excepcional, que me sabe a ginguba (que é amendoim).

O mufete é peixe. Peixe inteiro assado com todos. Ou melhor... assado com tudo. Escamas e tripas. Por cima e à volta é servido com uma mistura de pimentos e tomate. E jindungo. Mufete foi portanto coisa que não provei ainda. Evidente.
Jindungo é a malagueta daqui. Muito picante e muito diferente de sítio para sítio no tom e no sabor. Mas sempre muito picante. Aqui jindungo acompanha-se com tudo. Com pão com fruta e com todos os pratos. Só não acompanha comigo.

Resumindo, digo-vos que os pratos angolanos são muito bons e até recomendo. Mas eu cá sinceramente prefiro lagosta.

22.7.07

Dia 42 – O Ginásio

Mais um domingo que chega e um fim-de-semana que passa. Começo a pensar que é mais fácil contar as semanas que passam do que os dias que demoram e parece-me que 42 dias demoram bem mais do que 6 semanas. Ou então não.
Fico pelo hotel, como gostei de tornar hábito todos os meus luandinos domingos. E lembro-me (doido) de ir ao ginásio ao final da tarde. Sim, acho que já começo a sofrer de alguns ataques de loucura efémera, pura consequência dos meus dias aqui. Realmente dizem que a loucura é um dos sintomas que surge à sexta semana. Mais um.

O ginásio. Tinham-me dito muito bem e tal e convenceram-me a ir. Houve uma parte que exageraram nas descrições, mas enfim... o mundo também é dos homens.
Fiz algum desporto intenso e estranhamente fartei-me de suar sem me sentir cansado: realmente o banho turco é um desporto para o qual tenho algum jeitinho. Melhor só no jacuzzi que também experimentei e achei-me imbatível. Ou então a sauna ali mesmo ao lado…
Mas não vos quero mentir. A verdade é que também me cansei a valer. Quando dei por mim já eu corria (ok… mais ou menos) numa passadeira por dez (!) longos minutos. Dez, mas dos longos. Entretanto achei que isso era muito radical para mim (podia escorregar, claramente) e preferi depois optar pelo desporto de lazer.
Gostei. Senti-me liberto, por dentro e por fora. E hei-de voltar e quando voltar de Lisboa quero ver se junto a essa vontade a regularidade nas minhas idas ao ginásio. Quero ver se sim, pois no final confirmei algo que já vinha a desconfiar desde há uns dias atrás, e que até as pessoas daqui já me diziam com relativa e infeliz frequência - estou mais gordo! Pudera...

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